segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Humano, demasiado humano*

''Se você deseja ser excessivamente racional, desista. Em algum momento entrará em contradição. Se almeja ser extremamente cartesiano, matemático, desista. Em algum momento sua emoção o trairá. E, se conseguir ser racional e estritamente lógico, a vida perderá o sabor, o tempero. Estará apto para ser um alienígena, e não um ser humano." (Augusto Cury)

Taí, eu desisto de fingir que não sinto. Desisto de tapar o sol com a peneira e de fazer caber aqui dentro o que já não cabe mais em mim. Desisto de tentar impedir as palavras de jorrarem, expondo tudo que torna os batimentos descompassados assim. Desisto de olhar para os lados e subir em bondes sem rumo certo. Desisto de experimentar outros sabores se eu já sei bem que gosto eu prefiro. Desisto das tentativas vãs de preencher um espaço vazio cujo encaixe tem peça específica e pronta. Desisto de dar murro em ponta de faca, de bater a cabeça na parede, de dar nó em pingo d'água. Desisto de esconder o que é estampa. Desisto de ocultar o que escapole pelos olhos. Desisto de forjar sorrisos porque eles podem ser totalmente sinceros se e quando. Desisto desse pensamento racional, cartesiano, matemático que me faz crer que existem coisas intransponíveis. Desisto de fingir, de mentir, de negar. Desisto de criar histórias mirabolantes para justificar o que só caberia em uma história. Desisto de fugir dessa coisa que me persegue por meses e que nenhuma relutância minha foi capaz de vencer. Desisto de construir barreiras, muros de proteção, açudes de continência, na expectativa de que evitem a explosão. Desisto de relutar contra o desejo mais premente. Desisto de não ser o que eu sou. Desisto dessa vida de aparência, dessa convivência segundo os padrões e a depender de conformidades. Quero dizer, quero falar, quero deixar claro, quero explodir, quero instenso assim, quero descompassado assim. Quero ser humano.

*Nietzsche

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