terça-feira, 29 de março de 2011

Inescapável

Nessa brincadeira de esconder e mostrar, de fingir e falar, de omitir e contar, a gente vai fazendo curvas na razão e embotando a visão. Nessa tentativa vã de não se expor tanto, de proteger o que é mais frágil, de não transparecer o que explode, a gente vai dando nós na sensibilidade e escondendo as evidências. Nessa jornada tola e contraditória de querer não querer, de sentir sem sentir, de viver sem viver; a gente vai se agarrando aos quases, aos mínimos, aos pequenos sinais. Gastamos energia e tempo, perdemos momentos e palavras, desperdiçamos afeto e ternura no esforço hercúleo de esconder. Somos traídos pela ebulição do que é óbvio, pelo transbordamento dos containers internos, pela saturação da dúvida. Pleonasmo vicioso salta aos olhos e o que é fogo queima, o que é água jorra, o que é vento venta e não deixa mais nada em seu devido lugar. Tudo apenas para mostrar que não se esconde, não se finge, não se omite, não há como proteger o coração do que ele sente. É o que é e se queda, com mãos e pernas atadas e fita adesiva na boca, a razão.

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