(Festa de 1 Ano)
A menininha que eu fui sonhou muito e fez muitos planos para a vida toda. Muitos deles eram bem diferentes do que efetivamente aconteceu, outros tantos eram bem iguais. A menininha que eu fui sonhou em se tornar uma mulher forte, uma profissional bem sucedida, uma pessoa reconhecida por sei lá o quê e morria de medo de não conseguir encontrar um amor nem de vivê-lo. A menininha que eu fui temia passar a vida inteirinha cuidando da parte prática da vida, da parte objetiva e racional. Ela sempre achou que essa era a parte mais fácil: dependia só dela e de uma certa determinação. A meninha que eu fui é bem diferente da mulher que me tornei.
Há algum tempo, eu achava que tinha a vida toda pela frente. E é incrível pensar que, em poucos anos, tudo se define. Muito do que eu sou, alguns grandes amigos, uma parte importante da minha história de vida, o que definiu minha personalidade, quase tudo aquilo que me faz ser quem eu sou aconteceu nesses últimos anos. Eu não sou a mesma de dez anos atrás. Eu não tenho aqueles mesmos sonhos, eu não tenho mais aqueles objetivos que agora me parecem tão rasos e sem importância. Eu não vejo tudo pela óptica do meu próprio umbigo. Eu cresci. Não sei dizer bem ao certo exatamente em que ponto a transformação aconteceu, mas há tempos eu venho me sentindo mais adulta, mais madura, mais mulher e muito mais responsável pelo que vivo.
Eu não contava que a vida fosse passar tão rápido. Até lembro bem quando me disseram, no dia em que completei 15 anos, que dali pra frente seria tudo corrido. E é verdade. Sinto que dormi e acordei aqui. E nesse sono, a vida inteira mudou. As melhores e as piores coisas aconteceram. Olho para trás e não vejo uma curva ascendente, em que as coisas vão melhorando com o passar do tempo. Eu vejo tantos altos e baixos que é até difícil contabilizar. Eu vejo um ápice bem alto e vejo um fundo do poço daqueles que é bem possível pensar que nunca mais se sairá (embora, eu nunca tenha pensado exatamente assim). Eu vejo uma história bonita, com momentos lindos e com momentos tristes.
A parte prática da vida, na verdade, aconteceu mais ou menos como programado. Eu fui pra onde queria ter ido e a caminhada continua. E isso até que é bom. Não fico com aquela sensação de que não me falta mais nada. Falta, sim, ainda há o que fazer. A parte subjetiva da vida também aconteceu, melhor do que havia sido planejado até. Houve AMOR, houve filhos, houve a família de comercial de margarina que eu sonhei pra mim. Lamento ter durado tão pouco. Lamento ter sido uma piscada e, numa curva do caminho, estilhaçaram-se as perspectivas todas. De repente, só a certeza da efemeridade das coisas mundanas. Certeza essa que me fez enxergar o mundo com um novo olhar, com uma certa urgência, com uma capacidade incrível de tornar cristalino o que importa de verdade e o que não merece nem um segundo de testa enrugada.
A coisa boa de se estar no fundo do poço mais profundo que existe (Pollyanna feelings) é que lá só se tem duas alternativas: ficar ou subir. E até se pode ficar lá no canto escuro e seguro e quente e conhecido e triste. Porém, depois de algum tempo, tudo que se quer é sair dali. E eu saí. Eu decidi e saí. Travei minhas próprias batalhas internas, briguei com meus sentimentos, pensei que não fosse capaz de suportar, pensei que era um peso bem maior do que eu seria capaz de aguentar, pensei que a vida inteira pela frente seria mera sobrevivência. Só que não. Ao sair do escuro, descobri um mundo de luz. Recuperei a fé que havia perdido em algum lugar do caminho e percebi a transformação que esse esforço causou em mim.
De repente, eu me vejo aqui, às vésperas de completar 30 anos, em um lugar bem diferente daquele planejado há dez, quinze anos. Orgulho de ser quem eu sou, de não ter desistido naquele ponto em que isso foi opção, de ter priorizado o que era prioridade, de ter enfrentado a realidade dolorida e colorida que me foi imposta. Sinto-me abençoada por ter as pessoas que eu tenho por perto, por receber tanto carinho e tanto amor, por conseguir reconstruir minha vida sem andar pelo mundo como se carregasse o peso dele nas costas. Acredito que não é sorte ter encontrado de novo um amor. É fruto de escolhas íntimas feitas lá atrás, é decorrência dessa esperança de que algo bom estava ali na frente. Eu não fechei meus olhos para a vida e ela retribuiu em forma de surpresa. Outros presentes me foram lançados no caminho e que bom que eu escolhi abri-los e vivê-los. Sinto que, de tudo, tirei lições valiosas e aprendi a arte da resiliência.
Muitas coisas ainda doem. Para muitas delas, o que se pode fazer é apenas e tão somente encontrar uma forma de conviver, sem mascará-las, sem escondê-las. Eu estou em paz comigo mesma e continuo otimista demais, acreditando sempre que o pior já passou faz tempo e que agora a vida é de glória. Tenho muito mais a agradecer do que a lamentar. Tenho muito a celebrar, a comemorar. Eu sempre soube que a felicidade estava no percurso, no caminho que se trilha com alegria ao lado de quem se ama. Eu amo as pessoas que vão de mãos dadas comigo e eu estou feliz. Que venha, PELO MENOS, mais uns sessenta anos!