Foi sábado passado. Estava um dia frio (bem frio para os meus padrões cearenses) e chovia. Uma chuvinha fina, dessas que parecem tristeza, que me remetem imediatamente ao banzo de alguém que sofre sem nem entender direito o porquê. Eu tinha tentado contatar um alguém que me informasse o endereço preciso. Minhas buscas internéticas foram em vão. E, naquela manhã, ao abrir o facebook, a resposta de que eu precisava tanto estava ali. Ainda dava tempo! Joguei tudo no google maps e memorizei aqueles esquadros.
Corri para o banheiro. Usei meus apetrechos todos e me vesti como se fosse encontrar um amigo de longa data. Parece ridículo até contando agora, meio patético, talvez. Eu sei que entrei no táxi e pedi para me levar até a Av. Getulio Vargas e me deixar na quadra anterior à rua José de Alencar. Desci no Menino Deus dele e fiquei pensando, enquanto andava até à rua onde morou, quantas vezes ele passou por ali a pé, com as mãos enfiadas nos bolsos, tentando escapar do frio de Porto Alegre, com a cabeça girando em pensamentos e palavras e textos e contos e dores... Fiquei pensando, enquanto admirava as árvores frondosas e floridas, os prédios baixos sem muros, a rua de calçamento, as senhorinhas andando lentamente, o moço que passeava com um cachorro, que ele esteve ali, respirou ali, viveu ali seus últimos dias. Sim, era como se eu o conhecesse e como se tivesse saudade dele, alguém que quando descobri que existia nem existia mais. Pelo menos, não aqui.
Entrei na Rua Oscar Bittencourt e procurei o sobrado da família. Se tivessem me dado somente o nome da rua, eu a teria percorrido inteira e teria descoberto, pelas imagens que já havia visto, que era ali. A casa estava diferente, com ares mais modernos, com um verde mais vibrante colorindo a fachada. Havia carros na garagem e era estranho ver a movimentação das pessoas, uma mangueira ligada, uma piscina ao fundo. Não vi a placa com a frase dele que deveria estar lá. O jardim não é mais o mesmo, tiraram a árvore da frente, mas ainda guarda algumas roseiras. A janela no andar superior ainda abre por cima dele e deve ser uma delícia amanhecer por ali nos dias mais quentes.
Eu parei em frente à casa dele, sentei na calçada por alguns minutos e deixei minha cabeça abstrair um pouco dos meus problemas, das minhas dores, dos meus dissabores todos. Eu sentei e parecia que eu o conhecia enfim. Depois de tanto dividido, depois de tanto que me identifiquei, depois de tanto que li sobre, depois de tudo que vivi e ele viveu, depois do que ele escrevera antes mesmo de acontecer em mim, eu estava ali. Lacrimejei porque eu sei que a essência dele era de dor, de esperança e de intensidade, esse mesmo material de que sou feita. E pedi, em silêncio, para que dali em diante que seja doce, que seja doce, que seja doce para mim e para ele, onde quer que esteja.
PS: Visitei a casa de Caio Fernando Abreu em Porto Alegre no último sábado 25/08/2012, mais de 16 anos após a morte dele.
Corri para o banheiro. Usei meus apetrechos todos e me vesti como se fosse encontrar um amigo de longa data. Parece ridículo até contando agora, meio patético, talvez. Eu sei que entrei no táxi e pedi para me levar até a Av. Getulio Vargas e me deixar na quadra anterior à rua José de Alencar. Desci no Menino Deus dele e fiquei pensando, enquanto andava até à rua onde morou, quantas vezes ele passou por ali a pé, com as mãos enfiadas nos bolsos, tentando escapar do frio de Porto Alegre, com a cabeça girando em pensamentos e palavras e textos e contos e dores... Fiquei pensando, enquanto admirava as árvores frondosas e floridas, os prédios baixos sem muros, a rua de calçamento, as senhorinhas andando lentamente, o moço que passeava com um cachorro, que ele esteve ali, respirou ali, viveu ali seus últimos dias. Sim, era como se eu o conhecesse e como se tivesse saudade dele, alguém que quando descobri que existia nem existia mais. Pelo menos, não aqui.
Entrei na Rua Oscar Bittencourt e procurei o sobrado da família. Se tivessem me dado somente o nome da rua, eu a teria percorrido inteira e teria descoberto, pelas imagens que já havia visto, que era ali. A casa estava diferente, com ares mais modernos, com um verde mais vibrante colorindo a fachada. Havia carros na garagem e era estranho ver a movimentação das pessoas, uma mangueira ligada, uma piscina ao fundo. Não vi a placa com a frase dele que deveria estar lá. O jardim não é mais o mesmo, tiraram a árvore da frente, mas ainda guarda algumas roseiras. A janela no andar superior ainda abre por cima dele e deve ser uma delícia amanhecer por ali nos dias mais quentes.
Eu parei em frente à casa dele, sentei na calçada por alguns minutos e deixei minha cabeça abstrair um pouco dos meus problemas, das minhas dores, dos meus dissabores todos. Eu sentei e parecia que eu o conhecia enfim. Depois de tanto dividido, depois de tanto que me identifiquei, depois de tanto que li sobre, depois de tudo que vivi e ele viveu, depois do que ele escrevera antes mesmo de acontecer em mim, eu estava ali. Lacrimejei porque eu sei que a essência dele era de dor, de esperança e de intensidade, esse mesmo material de que sou feita. E pedi, em silêncio, para que dali em diante que seja doce, que seja doce, que seja doce para mim e para ele, onde quer que esteja.
PS: Visitei a casa de Caio Fernando Abreu em Porto Alegre no último sábado 25/08/2012, mais de 16 anos após a morte dele.