terça-feira, 31 de maio de 2011

Sobre amor e outras coisas

A Mirys manda, eu obedeço. E hoje, num dia difícil pra ela, num dia de dor, num dia em que a sensação de solidão impera de novo dentro do coração dela, ela resolveu espalhar boas vibrações pelo mundo incitando a blogosfera a falar sobre família e amor. Eu não sei fazer textos programados e/ou encomendados, mas falar sobre quem eu amo eu sei. Então ficou mais fácil.

Eu tenho uma família de verdade: meus pais e meus irmãos ainda saracoteiam pelo mundo e estão comigo rotineiramente. A gente briga, a gente se desentende, a gente grita muito, quebra o pau e, passados cinco minutos, continua conversando e rindo como se nada tivesse acontecido. Tenho orgulho de viver numa família assim, verdadeira e nada rancorosa. Tenho orgulho de poder dizer que somos absolutamente francos uns com os outros, sem mistérios, sem segredos que não possam ser divididos. E é assim: quem faz coisa errada, houve os esporros dos outros, numa reunião do conselho familiar, mas também sabe que ali estão justamente as pessoas com quem poderá contar sempre. Minha mãe diz que se orgulha dos filhos que ela criou. É que no momento de precisão mesmo, no momento do pega para capar, a gente mostrou que segura a onda, nós três mostramos isso. Pai, Mãe, Manu e Tiago: AMO vocês!

Aí, você vai e forma uma família para si. Ama alguém loucamente, ama de um jeito tal, que é como se a pessoa fosse parte do que você é. Ama de um jeito que se reconhece no outro, se mistura com ele, passar a ser dois, e depois três, e depois quatro. Você se vê, de repente, como mãe de dois seres que a olham como se você tivesse superpoderes. Você vê, em dois pequenos, a mistura perfeita e na proporção exata daquilo que você é com aquilo que quem você ama é. Você passa a entender a vida, a perceber porque a gente está nesse mundo caótico. Você passa a extravazar de amor, como se ele simplesmente deixasse de caber dentro de si. A m(p)aternidade transforma o casal e, como eu sempre digo, dá um nó cego na relação. E, por mais que a vida pregue surpresas absurdas e tenha puxado meu tapete no momento em que tudo se encaminhava para a paz que eu sonhei ter, eu sei - e acredito que todo mundo saiba - reconhecer o que foi vivido. Sei também que o simples fato de ter vivido esse amor fez a minha existência ter valido a pena. Não ficou nada por dizer, nada por fazer. O coração dele parou de bater nesse mundo com a convicção plena do meu amor, assim como eu sempre soube do dele, até quando ele quis omitir. Thi, Matheus, Thomás: AMO vocês!

E tem também uma galera que é como se fosse família para mim. E essa é uma das coisas que eu sei fazer melhor: manter amigos por perto. Ainda que eles não estejam fisicamente perto. Assim, eu fui angariando gente no decorrer dos anos. No começo, eram as meninas do prédio; depois a turminha do colégio; depois o pessoal da faculdade; os amigos do Thi que herdei depois do janeiro trágico; os que chegaram virtualmente... Os amigos se acumularam, com poucas baixas. E eu me vejo hoje convivendo com pessoas com quem tenho, em anos de amizade, o mesmo número que a nossa idade. Enquanto a maioria das pessoas não consegue contar nos dedos de uma mão o número de amigos de verdade; eu acho que nem com as duas eu conseguiria dar conta. E posso garantir que passaram todos pela prova dos nove. Sinto-me felizarda por conseguir manter essas pessoas por aqui comigo. Eu sei que eles sabem, cada um deles sabe, porque, por tradição familiar, eu faço questão de falar, de deixar claro o quanto são importantes para mim. Não teria como listá-los aqui, mas repito: AMO VOCÊS!

E pensando nessas pessoas, pensando no objetivo último dessa blogagem coletiva, eu chego mais uma vez à conclusão que eu mais repeti até aqui, a maior lição que tirei do pior momento da minha vida. O mais importante nesse mundo não é aquilo que se tem, mas QUEM se tem. O mais importante nessa vida não é fazer grandes coisas, descobrir a cura de uma doença até então incurável, fazer uma grande descoberta científica, escrever um tratado publicado e traduzido em diversos países, acumular bens e fazer fortuna. Não, gente. Não é nada disso. O mais importante nessa vida é estar ao lado de quem a gente ama, e poder, vezenquando, transformar a vida das outras pessoas com pequenos gestos de amor e doação. Porque o que a gente tem de melhor é o que carrega dentro de si, é o que escapa no olhar, é a ternura dos nossos beijos, é o carinho dos nossos abraços. E isso não há nada no mundo que possa substituir. A gente só vive de verdade quando ama e se doa para alguém, para os outros, por uma causa. E amar, assim como ser feliz, exige coragem. Coragem, meus queridos! Coragem!

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Sobre o tempo

Eu sei que só ele é capaz de fechar as feridas que foram abertas. Eu sei que só ele é capaz de abrandar as dores mais lancinantes, de acalmar os corações mais aflitos, de enternecer a alma, de produzir a experiência que cura a ansiedade. Só ele que traz gratas surpresas, faz tricô com os laços que a gente carrega pela vida, coloca o inesperado numa curva do caminho e traz a cola de boa qualidade para juntar todos os caquinhos em que se foi partido. É ele que faz com que as coisas ganhem novas perspectivas, é ele que brinca com os nossos sentimentos: quando queremos velocidade, ele anda devagarinho; quando queremos devagar, a velocidade da luz. É ele que é peralta com nosso coração e transforma aquilo que fez a gente se sentir minúsculo em motivo de boas gargalhadas. Faz com que as boas gargalhadas virem doces recordações. Faz com que esqueçamos quem nos magoou e porque fizeram isso e que fiquem guardadas para sempre o melhor de cada coisa e de cada pessoa. Ele dá tons de rosa ao que era cinza e pinta de azul o inverno. Ele faz crescer a nostalgia por uma infância que foi bem vivida e por uma adolescência bem aproveitada. Ele transforma o amor mais doente em coisa de adolescente e o amor mais feliz em saudade que se gosta de ter. O tempo é amigo, não posso negar, e age ininterruptamente em cada um com seu poder de império inescapável. O único problema é que ele passa diferente para cada pessoa, os ciclos terminam em tempos diferentes para cada um. Meu medo é que o tempo da cura seja maior que o tempo de espera e que, lá no final dos tempos, não esteja você.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Afeto em atitudes

Quando somos envolvidos e nocauteados por qualquer sentimento, eu acho importante que se exponha o que se está sentindo. É necessário colocar para fora e não deixar aquilo tudo se acumular dentro da gente. Digo mais: é importante mostrar para o outro o que nos agride, o que nos violenta e o que nos acalma e enternece a alma. Acho digno que se deixe a fúria explodir, as lágrimas caírem, o sorriso saltar. Acho lindo o extravazar. Para mim, essa tarefa nem sempre é fácil. Tenho sérios problemas em demonstrar fragilidade, mais ainda quando não me sinto segura e tranquila. Não é difícil me adivinhar, todavia. Eu demonstro o que movimenta o meu ser por inúmeras formas tangenciais além da fala. Sim, eu acho importante falar, mas acho mais importante ainda deixar inequívoco em atitudes.

E aí são pequenos gestos, sutilezas do bem querer, que demonstram o tamanho do sentimento e a profundidade da relação que se tem por/com alguém. Não é preciso grandes declarações, demonstrações públicas, gritos em desvario, serenatas, outdoors, propaganda em horário nobre. Não é preciso que o mundo inteiro saiba, que seja twittado ou compartilhado via facebook, que seja um vídeo acessado quinhentas e quarenta e cinco mil vezes no youtube. Não é preciso que seja insensato definitivamente. A verdadeira demonstração de amor acontece em brandas demonstrações de carinho e inequívocas comprovações do afeto. E, para mim, é muito mais fácil que seja assim.

É o celular que toca só uma vez e a voz do outro lado é de alegria. É conseguir perceber num olhar o que está escondido e muito bem trancado no mais profundo de dentro e ter liberdade para falar isso, assim, de cara, pá pum. É ter ouvidos que não se cansam de ouvir a mesma história, o mesmo tema. É estar de prontidão para as emergências mais fúteis e para as mais inúteis. É cuidado um com o outro, com o bem estar, com o que se come, como se dorme. É ouvir com atenção histórias longas e contadas nos mínimos detalhes e se lembrar de cada um deles dias depois. É pensar numa música tema para os momentos que se vive junto. É estar à disposição a qualquer hora, do dia e da noite, onde quer que se esteja. É não precisar de esconderijos, nem de subterfúgios, nem de desculpas, nem de escapar pela tangente por conta dessa relação. É ter certeza sobre o que sente, sobre o que o outro sente e, principalmente, sobre o que os une. É não ter motivo de reproche, de vergonha, de medo porque é o que se é. É saber a dimensão e a importância da relação e ser grato por isso. É se preocupar com a opinião do outro e também sobre o que os outros pensam dele, com o que pode feri-lo, com que pode magoá-lo e tentar protegê-lo das agruras do mundo. É ter cuidado, carinho, respeito para aqueles dias em que o coração tá cambaleando. É dividir devaneios tolos, uma fatia de bolo, uma pata gorda de carangueijo, uma pizza de pepperoni. É estar presente quando a companhia é o melhor presente, seja um dia de alegria, seja um dia de desmoronamento. É segurar a mão, oferecer o ombro, lenço de papel, um pastel, massagem no pé, camisa reserva, o carro, o colchão. É comprar o presente exato sem fazer a menor diferença o preço. É saber o que ele quer comer, antes que se peça o cardápio. É sentir-se agraciado quando consegue agradar. É abrir mão de coisas que se sabe que podem atingi-lo. É tornar importante o que é importante para quem se quer bem. É ver o mundo com os olhos de quem se ama e sempre está um pouquinho à frente, uns passos a mais, para que nada de mal o atinja. É uma gentileza, uma delicadeza e, às vezes, também uns puxões de orelha, uns sacolejos. Porque ninguém pode viver flutuando, é preciso manter os pés no chão. É uma entrega de alma que se faz por amor.

É claro que tem quem ame diferente, de um jeito mais ogro, mais tosco, mais grosseiro, ríspido até (who knows?). É claro que tem gente que não sabe nem demonstrar nem falar o que sente. Mas essa linguagem aí é universal e, muitas vezes, o afeto em atitude vale mais que as palavras. O que não sai pela boca, mas vem de coração, tem muito mais poder e deixa demonstrado de maneira cristalina  o bem querer.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Porque só o carinho resolve

 

Quando o coração desperta

Poderia, é claro, não ser nada disso se alguém não tivesse mostrado você pra mim, se a gente não tivesse conversado como amigos que se conhecem há muito, se a gente não tivesse se identificado instantanea e rapidamente desde o primeiro momento. Poderia não ter importância, não ter significado, não ser quase nada se a gente tivesse encerrado todo assunto no segundo ou terceiro email trocado. Poderia ter passado batido, ter caído no mais absoluto esquecimento, poderia ser só mais uma daquelas histórias de que a gente ouve falar se não tivesse trazido essa sensação de pertencimento e perenidade na vida. Poderia não ser nada demais se não fosse você e se não fosse eu. Se não fosse esse olhar de gente do bem, de coração bom, de gente que abraça com a alma. Se não fosse esse sorriso que ilumina os ambientes e aquece o coração. Se não fosse o seu nome ocupando espaços escondidos da minha mente, se espalhando pelos cantos do meu pensamento e adoçando minha boca. Poderia ser qualquer coisa, se não fosse seu jeito manso de falar, seu jeito profundo de olhar, seu talento para me desvendar. Poderia mesmo não ser nada disso, se em algum momento, qualquer deles, você não tivesse sido exatamente quem você é. Poderia fazer qualquer coisa, poderia ser o mundo todo, mas foi você, fomos nós dois e foi desse jeito. E então, foram inúteis e vãs todas as tentativas de esconder o que é, de aplacar o que transbordava, de conter o deslumbre. E então, todas tolas as vezes em que se quis disfarçar, omitir, sublimar. Muito boba a tentativa consciente e orientada de não ser amarrado por esse sentimento. E então, a gente entende, entendemos todos, que de nada vale a razão quando é o coração que desperta.

 

(Thais Racnela)

 

terça-feira, 24 de maio de 2011

Sobre os caminhos

Caminhar de mão dada em terreno irregular é coisa de difícil execução. Permanecer com as mãos entrelaçadas enquanto se passeia por sobre barrancos e pedras e buracos e deslizamentos no caminho é tarefa que exige um esforço hercúleo. É claro que ajuda demais ter uma mão ali, segurando firme a sua, quando você quase escorrega, quando se desequilibra, quando o pé derrapa na lama. Todavia, continuar segurando a mão do outro exige uma força que a gente nem sabe se tem.

Em determinados pontos do caminho, a gente se sente cansado e pesado e triste. Sente que está segurando a mão, as lágrimas, a dor, as pontas. Sente que está sendo privado de um caminho mais fácil, mais colorido, mais plano. Sente um certo desapontamento por ter escolhido esse caminho. Em tantos outros momentos, é possível elucubrar que as dificuldades porque se passa é para garantir robustez, resistência, sustância. É só um jeito meio torto de fazer com que não reste mais dúvida alguma sobre nada quando a parte plana do caminho chegar.

A gente sabe, porque é bem evidente, que a estrada é sinuosa, é tortuosa, que o acesso é precário, que não há faixas pavimentadas, que é um desbravamento contínuo. Cada passo dado é uma conquista. Cada pedaço de chão pisado é um deslumbre. Cada quilômetro percorrido é uma vitória. O problema - e talvez nem seja um problema mesmo - é ter bem claro, dentro de si, de um jeito pressentido, de um jeito inexplicável e surpreendente, que é esse mesmo o caminho que se quer. Ainda que seja assim difícil e cansativo e sofrido algumas vezes.

Já se disse uma vez que "para quem não sabe onde vai, qualquer caminho serve". E se a gente sabe, se bate bem dentro de si uma certeza que pulsa e empurra adiante, que traz mais uma fornada de coragem sempre que a razão ou o coração titubeia, se se tem uma certeza que ilumina a escuridão do caminho inteiro; então a gente também sabe que, pouco importam os buracos, os barrancos, os abismos ao lado do caminho, pouco importam os deslizamentos e os desequilíbrios e as derrapagens no percurso. Porque quando a gente sabe para onde está indo o caminho é só um detalhe.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Um dia feliz

Não é preciso nada extraordinário para que um dia feliz aconteça. Não é preciso muito, não é preciso tudo, não é preciso de nada material. Um dia feliz é feito de pequenas sutilezas, de pequenos momentos, de coisinhas delicadas que preenchem todas as horas e aquecem o coração de maneira indubitável. Um dia feliz é feito com ligações e palavras carinhosas de madrugada, com preguiça acompanhada na cama, com cheirinho na cabeça de um bebê, com beijo lambuzado de um grandão. Um dia feliz é feito de gente muito querida lembrando de você e desejando, de coração, tanta coisa boa, tanta energia positiva, tanta vibração, tanta felicidade, que se torna simplesmente impossível não se alegrar. Um dia feliz é feito com comida de mãe, na companhia da família mais louca, mais desajustada, mais gritadeira e mais querida que existe. Um dia feliz é feito com soninho no meio da tarde, com beijinho estalado na bochecha, com telefone que não para de tocar e de receber mensagem. Um dia feliz é feito com inúmeras mensagens carinhosas nas redes sociais. Um dia feliz é feito de bolo de chocolate, de mesa cheia de amigos, de presentes singelos e exclusivos, de video-foto que faz chorar. Um dia feliz é feito apenas e tão somente por estar na presença de gente que quer bem a gente. É feito com coisas simples e corriqueiras, que qualquer um tem sempre à mão, que você mesmo pode alcançar agora, se quiser. Um dia feliz é a coisa mais simples que existe, basta olhar com cuidado para o que há ao seu redor e agradecer porque finalmente cada coisa está em seu devido lugar.

Obrigada a cada um de vocês que fez meu dia feliz ontem. PRICELESS!


sexta-feira, 20 de maio de 2011

Recomeçando

Recomeçar é ser capaz de buscar forças sabe Deus onde, depois de ter chegado ao exaurimento numa luta perdida. Recomeçar é ser capaz de ser benevolente consigo mesmo e reconhecer em si qualidades e potencialidades e perdoar os defeitos e as travas. Recomeçar é abrir clareiras para a construção de estradas novas. Recomeçar é deixar para trás o que é passado e olhar para frente com olhos de esperança. Recomeçar é saber que se havia caminhado um longo percurso mas na estrada errada ou que se tornou errada por algum caso fortuito ou força maior e aí, o que resta a fazer é dar meia-volta-volver. Recomeçar é saber que se perdeu tempo, dinheiro, fé, esperança, força, muito, se perdeu muito, mas que ainda assim é preciso continuar. Recomeçar é colocar de novo os pés no chão e deixar que a cabeça nas nuvens permita sentir um pouco do sonho que nos move. Recomeçar é ter sempre a crença de que, a despeito dos problemas, das dores, dos dissabores, das reviravoltas, o melhor nos espera em algum ponto do caminho e só o alcançaremos se continuarmos andando. Recomeçar é tentar de novo, mesmo sem querer, mesmo com o corpo dolorido, mesmo com feridas sangrando. Recomeçar é acreditar na vida e nas surpresas agradáveis que só nos arrebatarão se estivermos na estrada. Recomeçar é torcer para que o sorriso não saia mais do rosto e caminhar em busca de paz. Recomeçar é ter por certa alegria num futuro incerto, é apostar fichas no que é sem garantia, é ter a fé cega dos apaixonados pela vida. Recomeçar é sobreviver. Recomeçar é viver.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Abre essas janelas

Eu gosto tanto de você que, muitas vezes, prefiro mesmo esconder, como diz a letra da música do Lulu. Porque não é racional nem prudente. Porque é precipício e precipitado, porque é repentino e arrebatador, porque é como um vício bom, como um sonho bom, como um doce que se desmancha lentamente na boca e vai deixando sua doçura na vida.
 
Eu gosto tanto de você que eu tenho medo do que eu me torno por causa desse sentimento. Virei essa pessoa mais calma, mais tranquila, mais low profile, mais quieta, mais paciente, mais previsível, mais confiante, mais determinada. Virei essa pessoa que prima pelos assuntos, pelas conversas leves, inteligentes e sem fim. Virei essa pessoa que olha nos olhos e deita no colo, que abraça apertado como que possível unir o coração.
 
Eu gosto tanto de você que desconheço e muito me admira essa expectativa, essa esperança de que, um dia, este gostar seja algo concreto, com objeto e reciprocidade. Fico assustada com essa certeza que não quer ir embora de que é uma questao de tempo para que nossas dores permitam o florescer de um amor entre quem sofreu,quem se entende, entre quem luta e vibra e quer mais da vida, quem quer mais do amor.
 
Eu gosto tanto de você que muitas vezes é até difícil explicar, fico agradecendo sua presença, sua companhia, sua delicadeza, sua gentileza, suas palavras, seu carinho. Fico me desculpando pela minha invasão na sua vida, por sentir que entro demais, por querer sempre um pouco mais da sua atenção, do seu tempo, da sua vida, da sua palavra , da sua companhia. Não sei como nem porque você se tornou parte da minha rotina, do meu dia-a-dia, dos meus pensamentos, e do que sou também, porque me vejo transmutada por este bem querer.
 
Eu gosto tanto de você que me assusta essa entrega, essa espera, essa aposta sem garantias, essa paciência que eu nunca tive, esse desejo que me invade em sonhos. E é incrível que você nem reconheça os sinais todos que nos saltam à vista diariamente. É incrível que você não reconheça que essa identificação instantânea, essa proximidade ligeira, essa pulada de paraquedas na vida um do outro, nada mais é que um cheirinho de amor que só precisa de um terreno fértil para desabrochar. "Abre essas janelas, primavera quer entrar, pra fazer da nossa voz uma só nota"
 
(Escrito em Dezembro/2010)

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Cicatriz

"Nas pernas escuras da moça havia muitas cicatrizes brancas pequeninas. Eu pensei: Será que essas cicatrizes estão no seu corpo inteiro, como as luas e estrelas no seu vestido? Achei que isso também seria bonito, e peço-lhe neste instante que faça o favor de concordar comigo que uma cicatriz nunca é feia. Isto é o que aqueles que produzem as cicatrizes querem que pensemos. Mas você e eu temos de fazer um acordo e desafiá-los. Temos de ver todas as cicatrizes como algo bele. Combinado? Este vai ser nosso segredo. Porque, acredite em mim, uma cicatriz não se forma num morto. Uma cicatriz significa: 'Eu sobrevivi'.
 
Daqui a pouquinho vou falar umas palavras tristes para você. Mas você deve escutá-las da mesma maneira como combinamos ver as cicatrizes. Palavras tristes são apenas uma outra forma de beleza. Uma história quer dizer: essa contadora de histórias está viva. Daí a pouco, alguma coisa boa vai acontecer com ela, uma coisa MARAVILHOSA, e ela vai se virar e sorrir." (CLEAVE, Chris. Pequena Abelha. Intrínseca, 2010: p. 17)

terça-feira, 17 de maio de 2011

Cantem comigo: ei, ei, ei, Gabito é nosso rei!

Droga, viu? Da minha ilha emancipada, cercada de sombra e mar revolto, vem você, invade, e faz um país. Não foi uma luta justa, eu lá me esforçando pra ser mulher e você estrala os dedos, puxa meu queixo e me faz menina tudo outra vez.
 

Guarda-chuva

- Você bem poderia estar sozinho, não é mesmo? Ou, sei lá, estar com outra pessoa desfilando por aí. Uma menina dourada, quem sabe. Os ombros mais erguidos, o sorriso mais arqueado, os olhos reluzindo, falando alto aquelas bobagens bem sacadas que ninguém mais faz, senão você. Mas tá aqui, comigo. Meio quieto, um pouco soturno, às vezes deita no sofá da sala, de ponta-cabeça, com uma assustadora fisionomia de tédio, assistindo trabalhar aflita no computador. Desvirtuando minha rotina, me impacientando, com o cheiro da minha casa, das minhas coisas, do meu medo de um dia você levantar repentinamente, pegar as chaves e dizer que não sabe se volta.

- Gosto daqui. De te telefonar já na terça-feira perguntando se posso voltar. De trazer um doce que te acalma, se você trabalha aflita no seu computador. Você é a única pessoa que eu queria conhecer bem e levar junto no peito nessas ocasiões especiais chatas que só servem pra masturbar minha vergonha alheia do mundo, depois te contar e rir contigo.

Sei viver sem você, oficialmente falando. Mas eu não quero, não vou. Eu poderia te dizer aquelas doces mentiras sinceras - "Você-é-minha-vida", "Não-sei-o-que-seria-da-minha-vida-sem-você" ou todo esse tipo de porcaria que a gente diz no calor da hora. As pessoas são assim, dizem que não sabem viver sem você. Depois aprendem e esquecem de comemorar contigo. E deixam vazio o lugar que sempre será delas. Eu não, simplesmente estou aqui. De vez em quando sujo, entediado, agressivo, mal-humorado, triste, calado e chato. Mas aqui.

Não há lugar ou motivo no mundo capaz de me afastar. Já fui a todas as festas que tive oportunidade, fui a todos os shows, praças, bares, drogas, músicas, ruas, modas e também já comi todas as biscates que precisei pra realmente me sentir homem, seu homem. Nada mais funciona. Nada na vida é mais excitante que ter alguém que te abrace por trás, entrelace os dedos e diga seu nome de batismo, estendendo um chá de erva-cidreira.

Porque eu te encontrei, da forma mais esdrúxula e inesperada. E me apaixonei pelo cheiro e pelo balanço meigo e suave dos seus quadris. E como duas sacolas plásticas que se enroscam na cidade, no meio do caos, movidos por um breve redemoinho pré-chuva, a gente resolveu que ia se amar. E ninguém sabe melhor sobre nós, que nós. Ninguém poderia me dar um só argumento pra que eu devesse ficar sem você. Que dirá essa gente lá fora, cheias do Complexo de Romeu e Julieta.

No show a sol e céu aberto do nosso cantor favorito ou assistindo um filme mal dublado na tevê, nós curtimos estar juntos o tempo todo. Resposta oficial: eu poderia estar por aí, com outro alguém, injetando as sensações vertiginosas de ser livre e procurado, mas dei uma abertura ao verdadeiro amor.

E nada é mais importante que isso, que é sim, às vezes pasmo, repetitivo e bucólico, mas é real. É isso, é preciso abrir mão de uma porrada de coisas se você não quiser ficar sozinho à noite, vagando pelo seu apartamento minúsculo com o maior corredor do mundo. Vê se um dia você entende. Pensa nisso. E pode largar mão do seu guarda-chuva contra as paixões. Até porque, nem tem chovido tanto assim.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Tomara que sim

Tem dia que eu acho que não tem nada a ver, que é maior forçação de barra da história do Brasil, que é a ilusão romântica de uma história novelesca, de um final feliz, alguma redenção, alguma compensação depois de tanta dor, algo que seria bonito até de contar se tudo desse certo no final. Tem dias que eu sinto dentro de mim que tá tudo errado, que não era pra ser assim, não era para vivermos essas amputações e persistir apoiados um no outro, como se a nossa companhia servisse para reequilibrar o caos interno, para tamponar algumas feridas e para embaçar um pouco a visão. Tem dias que eu penso que nem eu mesma quero estar aqui, que me engano com o conto de fadas, com o "seria perfeito" que ouvi tantas vezes, que eu acho que é ilusão tecendo crochê dentro de mim. Tem dias que eu tenho uma quase convicção de que não vai dar certo, de que não é nada disso que a gente tá pensando e que não tem nada a ver. Em vez de leve, natural, tranquilo, feliz, é uma história amarrada com correntes pesadas e com um passado muito difícil de suportar. Tem dias que eu acho que não, melhor não.
 
Mas quando toca o telefone e escuto do outro lado a doçura da sua voz, o carinho para comigo, o cuidado com cada coisinha nossa de cada dia. Quando eu sinto o quanto faz bem, o quanto é leve, natural, tranquilo e feliz, mesmo com as correntes pesadas que arrastamos. Quando eu sinto que é a companhia mais presente dentre todas, mesmo daí. Quando eu percebo os sorrisos que surgem nos nossos rostos quando estamos juntos, a alegria que resplandece no olhar e as gargalhadas que arrancamos constantemente. Quando eu sinto que não somos uma escora, uma muleta que ajuda a suportar, mas o ceú azul depois da tempestade, o raio de sol depois do inverno mais congelante, a trégua depois de vários terremotos. Quando eu sinto o coração apertado quando dói em você e quando eu vejo você ler na minha alma o que está escondido no mais profundo de mim como se estivesse estampado na face. Quando eu sinto essa intimidade, essa cumplicidade e essa incrível e surpreendente sintonia que nos conecta. Quando a gente fala a mesma coisa ao mesmo tempo, quando eu penso em você e o telefone toca em seguida, quando se entende pelo tom de voz que o dia não foi bom. Quando eu me pego imaginando e revivendo, quando eu me vejo pensando em coisas para surpreender, quando eu me percebo em transformação não por imposição mas por sentir e aprender. Quando eu vejo o quanto é espontâneo e recíproco e doce. Quando eu me vejo pensando que é o melhor de cada dia todos os dias. Quando eu me sinto querida, ajudada, cuidada, amada. Quando eu tenho esses pressentimentos e previsões que são corriqueiramente confundidos com expectativas e desejos. Quando eu entendo que não é só uma boa história novelesca, não é só um lindo roteiro adaptado para a vida real, não é só um enredo emocionante, mas é o que é, somos eu e você, com nossos limites e problemas e entraves e medos e receios e impulsos e desejos e essa liga que amarra a gente. Quando eu penso em tudo isso, eu penso que sim, tomara que sim e que não haverá nada que me faça arredar o pé daqui.

domingo, 15 de maio de 2011

It's not a race at all

"Look at us: running around, always rushed, always late. I guess that's why they call it human race. What we crave most in this world is connection. For some people it happens at first sight. That's when you know, you know. It's fate working its magic. And that's great for them. They get to live in a pop song. Ride the express train. But that not the way it really works. For the rest of us it's a bit less romantic. It's complicated and it's messy. It's about horrible timing and fumbled opportunities and not being able to say what you need to say when you need to say it.

Look at us: running around, always rushed, always late. I guess that's why they call it human race. But some times, it slows down just enough for all the pieces to fall into place. Fate works its magic and you're connected. Every once and awhile, among all the randomness, something unexpected happens and it pushes us all forward. And the truth is, what I'm starting to think, what I'm starting to feel is that maybe the human race isn't a race at all."

From: The Switch
Música: All the beautiful things - Eels

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Quando pega de jeito

Você tá lá perdidinha da silva, já fez a curva do Cabo da Boa Esperança, já tá passando da idade, já não aguenta mais as tias, as primas, o irmão mais velho, a vizinha perguntando quando você vai arranjar um namorado e se aquietar. Você não aguenta mais as baladinhas, os carinhas, as festinhas e essa vida de encontros furtivos e alto teor alcóolico. Você não aguenta mais os domingos à noite, o cinema sozinha, a falta de jantarzinho à luz de velas, a dois. Você não aguenta mais essa dor que num se cala, esse aperto no peito que mais parece torção, essa solidão sem fim.

Você tá lá perdidinha da silva, já fez a curva do Cabo da Boa Esperança, já viveu uma história incrível, já casou de branco, já apostou suas fichas, já insistiu até não aguentar mais porque era um casamento, porque era um AMOR, porque era para ser para sempre. Você já sentiu no fundo do peito a dor de ver a relação deteriorando, definhando, amargando até não restar mais nada do que antes a fizera feliz. Você sofreu e agora não aguenta mais os domingos à noite, o cinema sozinha, a falta de jantarzinho à luz de velas, a dois. Você não aguenta mais essa dor que num se cala, esse aperto no peito que mais parece torção, essa solidão sem fim.

Você tá lá perdidinha da silva, já fez a Curva do Cabo da Boa Esperança, já teve seus filhos, já escreveu um livro, já conquistou sua independência, mata seus leões de cada dia, paga suas contas sozinha e em dia, manda no seu próprio nariz, resolve seus problemas como equações e anda pelo mundo com jeito de quem sabe bem o que quer. Você até que sofreu e até que sorriu. Você até que amou e desamou, traiu e foi traída. Você viveu e até venceu, mas no fundo, não aguenta mais os domingos à noite, o cinema sozinha, a falta de jantarzinho à luz de velas, a dois. Você não aguenta mais essa dor que num se cala, esse aperto no peito que mais parece torção, essa solidão sem fim.

Aí, né? Meio sem querer querendo você dá de cara com alguém que chega adoçando a vida e devolve as borboletas que debandaram em revoada quando a última lágrima caiu, amaciando um coração estancado e petrificado, devolvendo cor e descompasso aos dias até então modorrentos. Aparece alguém assim, do nada, cai de paraquedas na sua vida e com manual de instruções - sobre como desarmar cada uma das suas válvulas escapatórias e como ultrapassar cada uma das cem paredes de proteção - decorado. Vem dando beijos profundos na sua boca, olhando você nos olhos e lendo sua alma, falando sacanagens impublicáveis no seu ouvido e fazendo suas pernas cambalearem, suas mãos suarem e o mundo girar.

Aparece, de repente, alguém assim, que devolve a ânsia de encostar a cabeça no ombro, de dormir de conchinha, de ser carregada no colo, de andar de mãos dadas, de ser cuidada, mimada, massageada. Alguém que devolve a fé no casamento e a vontade de casar de branco. Alguém que faz você suspirar nas tardes de chuva, que faz seu corpo amolecer com as inúmeras possibilidades de. Alguém que faz você sonhar com uma família grande, com casa cheia, com fotos na sala com uma penca de sorrisos, com cachorros e decoração da casa de veraneio, com churrasco com família reunidas.

E aí, você vai desejar que esse alguém tenha certeza do sentimento que une vocês dois e do quanto é raro e especial e único e excepcional esse encontro. Vai desejar que ele entenda cada uma das suas nóias, e bobeiras, e ciúme toscos, todos bobos e que decorrem apenas do amar demais. Que ele saiba acalmar seu pranto quando ele explodir, arrancar sorrisos quando as coisas estiverem confusas, que adore suas DRs porque você expõe o que sente, que entenda seus sentimentos ainda que não concorde com eles e que faça simplesmente de tudo para que as coisas funcionem entre vocês.

Você vai querer que ele abandone tudo quando só o abraço dele for solução. Você vai querer poder ser menina, bebê, moleca, louca, esquizofrênica, autoritária e que ele te olhe como quem entende cada um dos seus achaques. Você vai querer ter certeza ao olhar nos olhos dele de que é amor até o último fio de cabelo. Você vai querer que ele esqueça, vezenquando, os amigos, o futebol de domingo, a cervejada com a galera só pra matar o tempo ao seu lado.Você vai querer que ele lembre de você quando ouvir uma música, quando se deparar com sua sorveteria favorita, quando passar na frente do prédio em que você trabalhou e até sem motivo algum, só porque teve saudade. Você vai querer que ele fale e demonstre e grite aos quatro cantos o quanto esse amor inundou a vida dele.

Você vai se ver querendo que ele morra de tesão por você, que ache gostoso seus pneuzinhos, que goste da sua bunda meio caída e até das celulites nas suas coxas. Você vai querer que ele te ache única, linda, perfeita. Você vai querer fazer amor e sexo selvagem ao mesmo tempo agora e vai enlouquecer numa cama só de vocês.  Você vai imaginar a adição do sobrenome dele e vai achar lindo. Você vai imaginar vocês velhinhos e vai achar lindo. Você vai imaginar as brigas cotidianas e vai achar lindo. Você vai saber que ele tem pêlos no nariz, uma coceira no pé, o calcanhar descascado, um buchinho de chopp, um dente meio torto e tudo isso vai incrivelmente fazer parte daquilo que te faz louca por ele.

Você vai achar pela primeira vez e de novo que é o homem da sua vida e que é com ele a família que você sonhou. E aí você vai passar a torcer que o beijo não perca o sabor com a rotina, que as conversas não diminuam com o saber-se próximo, que o interesse não se perca ao se deparar com o rebolar de outras ancas. Vai torcer para que a paixão vire amor e para que o amor mantenha a chama da paixão. Vai torcer para ser só dele e que seja para sempre. Vai dormir e acordar com isso martelando na cabeça e vai entender, assim profunda, inequivoca, e declaradamente, que é nesse momento que a vida vale muito a pena.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

Eu também

"Eu prezo o amor que é gasto com prazer, que é escasso, raro e inquieto. Tenho preguiça do que é a prazo, do lento, do morno abrandado com soprinhos. Faço passeatas é pelo amor singular, especial, que tem pressa, fome e sede de ser. Não pra ser breve mas porque não se contém. Aquele que derruba os limites das quatro paredes e grita aos sete cantos a quê veio, que não pára na primeira topada pra ajuste de falsos moralismos ou pra consenso de olhares de reprovação. Sou fã de amores de verão que duram todas as estações, de encontros não permitidos e conquistas diárias sagradas por suas singularidades. De gestos que entregam a intensidade, o nome, endereço e RG do sentimento sem medo de denunciá-lo abertamente. Bato palmas é pros amores de fim de dia estressante, comida pronta pra dois, duas taças ou uma adega inteira de vinho tinto pra eternizar datas inventadas pra somar. " (Yohana SanFer)

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Quando menos se merece

Procure me amar quando eu menos merecer,
porque é quando eu mais preciso
 
Falamos e ouvimos à beça sobre o amor desde pequenininhos, já sabedores ou não do que se trata ou minimamente da vizinhança disso. E, apesar das nossas singularidades, costumamos ter pelo menos um desejo comum: queremos amar e ser amados. Amados, de preferência, com o requinte terno da incondicionalidade. Na celebração das nossas conquistas e na constatação dos insucessos. No apogeu do nosso vigor e no tempo do nosso encolhimento. Na vez da nossa alegria e no alvorecer da nossa dor. Na prática das nossas virtudes e no embaraço das nossas falhas. Mas não é preciso viver muito para percebermos que não é assim que o amor, na prática, costuma acontecer.

Temos facilidade para amar o outro nos seus tempos de harmonia. Quando realiza. Quando progride. Quando sua vida está organizada e seu coração está contente. Quando não há inabilidade alguma na nossa relação. Quando ele não nos desconcerta. Quando não denuncia a nossa própria limitação. A nossa própria confusão. A nossa própria dor. Fácil amar o outro aparentemente pronto. Aparentemente inteiro. Aparentemente estável. Que quando sofre, para não incomodar, por costume ou vaidade, não faz ruído algum.

Fácil amar aqueles que parecem ter criado, ao longo da vida, um tipo de máscara que lhes permite ter a mesma cara quando o time ganha e quando o cachorro morre. Fácil amar quem não demonstra experimentar aqueles sentimentos que parecem politicamente incorretos nos outros e absolutamente justificáveis em nós. Fácil amar quando somos ouvidos mais do que nos permitimos ouvir. Fácil amar aqueles que vivem noites terríveis, mas na manhã seguinte se apresentam sem olheiras, a maquiagem perfeita, a barba atualizada.

É fácil amar o outro na mesa de bar, quando o papo é leve, o riso é farto, e o chope é gelado. Nos cafés, após o cinema, quando se pode filosofar sobre o enredo e as personagens com fluência, um bom cappucino e pão de queijo quentinho. Nos corredores dos shoppings, quando se divide os novos sonhos de consumo, imediato ou futuro. É fácil amar o outro nas férias de verão, no churrasco de domingo, nos encontros erotizados, nas festas agendadas no calendário do de vez em quando.

Difícil é amar quando o outro desaba. Quando não acredita em mais nada. E entende tudo errado. E paralisa. E se vitimiza. E perde o charme. O prazo. A identidade. A coerência. O rebolado. Difícil amar quando o outro fica cada vez mais diferente do que habitualmente ele se mostra ou mais parecido com alguém que não aceitamos que ele esteja. Difícil é permanecer ao seu lado quando parece que todos já foram embora. Quando as cortinas se abrem e ele não vê mais ninguém na plateia. Quando até a própria alma parece haver se retirado.

Difícil é amar quando já não encontramos motivos que justifiquem o nosso amor, acostumados que estamos a achar que o amor precisa estar sempre acompanhado de explicação plausível, estatísticas promissoras, balancetes satisfatórios. Difícil amar quando momentaneamente parece existir somente apesar de. Quando a dor do outro é tão intensa que a gente não sabe o que fazer para ajudar. Quando a sombra se revela e a noite se apresenta muito longa. Quando o frio é tão medonho que nem os prazeres mais legítimos oferecem algum calor. Quando ele parece ter desistido principalmente dele próprio.

Difícil é amar quando o outro nos inquieta. Quando os seus medos denunciam os nossos e põem em risco o propósito que muitas vezes alimentamos de não demonstrar fragilidade, vulnerabilidade, invencibilidade, lógica. Quando a exibição das suas dores expõe, de alguma forma, também as nossas, as conhecidas e as anônimas, as antiquíssimas e as recém-nascidas. Quando o seu pedido de ajuda, verbalizado ou não, exige que a gente saia do nosso egoísmo, do nosso sossego, da nossa rigidez, do nosso faz-de-conta, para caminhar humanamente ao seu encontro. E, ao encontrá-lo, talvez lhe dizer a verdade: "eu sei o quanto você está doendo porque eu já doí também" ou "eu sei o quanto você está doendo porque estou doendo também, agora" e/ou "porque vivo, eu estou à mercê de doer de novo."

Difícil é amar quando o outro repete o filme incontáveis vezes e a gente não aguenta mais a trilha sonora. Quando caminha pela vida como uma estrela doída que ignora o próprio brilho. Quando se tranca na própria tristeza com o aparente conforto de quem passa um feriadão à beira-mar. Quando sua autoestima chega a um nível tão lastimável que, com sutileza ou não, afasta as pessoas que acreditam nele. Quando parece que nós também estamos incluídos nesse grupo.

Difícil é amar quem não está se amando. Mas esse talvez seja, sim, o tempo em que o outro mais precisa se sentir amado. Eu não acredito na existência de botões, alavancas, recursos afins, que façam as dores mais abissais desaparecerem, nos tempos mais devastadores, por pura mágica. Mas eu acredito na fé, na vontade essencial de transformação, no gesto aliado à vontade, e, especialmente, no amor que recebemos, nas temporadas difíceis, de quem não desiste da gente. Acredito porque nos momentos mais doídos da minha jornada até aqui eu nunca encontrei nenhum botão mágico, mas tive fé, tive gesto, e, felizmente, tive quem me amasse sem desistir de mim.
 
(Ana Jácomo)

terça-feira, 10 de maio de 2011

Doendo

Se existisse um botão on/off, certeza de que eu apertaria off hoje. Se existisse um mecanismo para transferir para uma pasta esquecida do HD, certeza de que era lá que estaria. Se existisse uma maneira de tirar de dentro de mim um pouquinho, só para que eu enxergasse tudo sem estes olhos de esperança, sem esse querer que cega, certeza de que eu toparia na mesma hora. Se eu pudesse expulsar de mim, ainda que para ser invadida de novo depois, eu faria. Mas não posso, não dá. Eu não sei tirar de mim aquilo que fez raiz profunda. Eu não consigo olhar com imparcialidade essa realidade que me tomba, que me devora, que me entontece. Tá aqui de um jeito inegável e da mesma forma que me alegra, que me dá muitos motivos para sorrir, que me faz feliz e me devolve uma sensação de pertencimento e paz, às vezes, me machuca demais. Eu nem queria ser vulnerável, frágil, nem me sentir exposta assim. Eu não queria mesmo, mas me pego sofrendo sem querer e de uma maneira tão contundente que me assusta. Olho pra mim aqui, com essa poça de lágrimas no travesseiro e me pergunto quando foi que as coisas tomaram esse rumo e não consigo encontrar nenhuma resposta convincente. Eu achei que conseguiria equilibrar esse pratos, eu achei que conseguiria me colocar numa posição de pé atrás e de prudência, eu achei que eu saberia ser a pessoa equilibrada, ponderada, aritmética e, no entanto, me pego em plena queda livre no precipício, sem paraquedas, sem redes de segurança, sem colchão do corpo de bombeiros. Eu me pego tão envolvida nesse sentimento que eu não sei o que fazer comigo mesma sem você por perto e acabo me deixando largada aqui, nesse quarto, com as cortinas fechadas para esperar só o tempo passar até você voltar. Eu não sei explicar direito a dor dilacerante que essa ausência provocada por mim me causa, eu sei que é uma sensação desesperadora, é aquela coisa que não cabe e não assenta, que impede o ar de entrar tranquilamente nos pulmões, que impede a fala de sair sem soluços, que impede o olhar de alcançar o que existe de mais belo no mundo, que impede o coração de se alegrar com a vida que vibra ao redor. Eu não sei dizer como eu deixei as coisas chegarem a este ponto, mas eu sei do que eu sinto e tem doído demais.
 

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Dentro de mim

Preciso de segurança, de amor, de compreensão, de atenção, de alguém que sente comigo e fale: Calma, eu estou com você. (Caio F.)

Mas é no silêncio que eu encontro a paz e a tranquilidade para entender que é dentro de mim que moram todas as respostas. Dentro de mim, estão guardados meus quereres, minhas vontades, meus sonhos e projetos, minhas expectativas e meus desejos mais íntimos e secretos. Dentro de mim, mora alguém que sabe o que quer, que se entende e se reconhece. Dentro de mim, existe alguém que sabe lidar com a vida, com as alegrias e com as dores sozinha. Há por aqui, perdida em algum lugar, alguém que sabe caminhar sem esse apoio, sem essa dependência, sem essa carência. Dentro de mim, existe uma força que eu nem sabia que existia. Força que faz os olhos brilharem e devolve ânimo e vigor quando a luta parece excruciante. Dentro de mim, há alguém que vai até o depois do final do além em pé e a pé. Dentro de mim, há alguém que racionaliza as emoções, emocionaliza os argumentos e decide com parâmetros lógicos e impulsos. Dentro de mim, há uma contradição que se debate e, vezenquando, até me abate, mas que no fim das contas sabe bem onde é que quero estar. Dentro de mim, há uma pessoa firme que sabe pra onde vai e com quem pode contar. Dentro de mim, há certezas e dúvidas que se amontoam como poeira nos cantinhos das paredes e, muitas vezes, me deixam perdida e confusa sem saber o que é uma e o que é outra. Ainda assim, dentro de mim, há claramente definido o que eu suporto e o que não, o que eu topo e o que não. E, mais importante do que tudo isso, dentro de mim, mora uma pessoa que aprendeu com a vida e a duras penas a mudar a rota que havia sido traçada e a recomeçar do zero, mesmo que doa, mesmo que sofra, mesmo que falte o ar.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Gabito Nunes, meu rei!

"Mas a vida é lotada de meninas com esse quê de "sei-lá-o-que-ela-tem-mas-tem-algo-como-ninguém". (...) Vai ver ela tem o dom. É doce, melodiosa, dedicada ao mesmo tempo que histérica, safada, louca. Provoca um coquetel de tesão na mesma medida de pavor, resultando num afã desgovernado de levar pra casa, dar banho e uns carinhos. Quando temos os olhos hipotecados pelo jeitinho dela, todas as outras parecem via de regra. (...) Pode ser a voz, o piscar, o andar, a forma como estrala as costas, a combinação das roupas, o sorriso rasgado que ilumina o ambiente, a careta que faz quando corta o dedo. Alguém que reluz, camufla os demais, é posto em relevo, que incha suas pupilas. São essas incríveis e inexplicáveis arestas da paixão que excepciona um só no meio de tantos outros. Pessoas que, ao se aproximarem, nos deixam assim, sem jeito."

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Laissez passer...

Eu sei que não faz sentido, eu sei que precipitado, eu sei que pareço louca, bipolar, frágil e carente demais, eu sei que não é para ser assim, eu sei que nem tenho esse direito, eu sei que é um passo grande demais, eu sei que é arriscado e louco, eu sei que pareço um tanto quanto perturbada e insegura, eu sei que a minha convicção não convence, eu sei que não parece que estou certa, eu sei que eu cambaleio até nos argumentos, eu sei que as minhas palavras não são tão firmes, eu sei que deveria ser menos impulsiva, eu sei que não deveria sentir dessa forma, eu sei que deveria tomar mais cuidado com o que digo, eu sei que não deveria ser cobrança, ser pesado, ser uma demanda, ser o que é. Eu sei. É que quando dói, a vista embaça e os sentidos se perdem. Eu sempre prefiro calar a falar, eu sempre prefiro esperar passar. E passa. Sempre passa. Taí uma coisa que eu aprendi: qualquer coisa passa. Não no sentido de se perder para sempre num breu da memória, mas simplesmente sai de foco e dá espaço para urgências, para outras coisas que são prementes. E, uma vez passado o que parecia insuportável, a gente consegue seguir tranquilo, quase perfeitamente. Deixa passar. Laissez tomber, laissez passer.

terça-feira, 3 de maio de 2011

O mais extremo ódio com o mais extremo amor

Carpinejar dando uma aula sobre a verdadeira face por trás da vingança. Deleite...
 
 
 
A vingança encharca a literatura e a música, mas seus mistérios jamais serão esgotados.

Vingança é uma arte, o refinamento da carência. Quem procura se vingar do ex ou da ex, na verdade, não cansou de brigar. Não terminou de argumentar. Vingança é discutir o relacionamento sozinho, é discutir o relacionamento à distância, é dedicar o dia inteiro, às vezes a vida inteira, a arquitetar uma forma de chamar a atenção do amante que negou o ouvido.

O luto é destinado aos que amam amar. Vinga-se a pessoa que odeia amar, odeia continuar amando. É o encontro do mais extremo ódio com o mais extremo amor. A união de dois terrorismos.

Vinga-se aquele que acredita que deu mais do que recebeu e que se enxerga ludibriado. Aquele que, durante a relação, cobrava em segredo tudo o que oferecia, listava presentes e gestos. A vingança é o juízo final do avarento amoroso.

Indica também prepotência. O vingador se enxerga superior ao vingado, mais experiente e sábio. Acha que está ensinando seu antigo par. Encarna a figura de professor repreendendo o erro do aluno. Assim como não sofre em vão, somente se humilha para humilhar o outro. Todo sofrimento é arrogante, debitado na conta do desafeto.

O vingador cobiça a última palavra pois não aceita que alguém pense o pior dele. Planeja castigar as supostas distorções e intimidar as possíveis confissões de sua intimidade. O vingador vive por hipóteses. Não entendeu que a última palavra não existe, é uma desculpa para mandar.

A vingança é o mais paradoxal dos atos: um sentimento inteligente em mãos burras e desgovernadas; uma pressa que exige longa paciência e dissimulação. Requer as mais contraditórias atitudes: sangue frio de alguém com sangue quente; calar-se apesar da exagerada vontade de falar.

A vingança fracassa pela ânsia de fama do seu autor. Quem busca se vingar pretende que o outro saiba que foi ele, que não tenha nenhuma dúvida. Deseja dar o troco beijando a boca, olhando nos olhos. Conclui que não adianta nada uma vingança sem remetente. E peca pela ambição, erra ao se expor, porque a represália aguda e exitosa esconde o criminoso para a perfeição do crime; deve ser anônima, gerando a desconfiança, mas não entregando totalmente o seu mentor.

Não conheço vingança perfeita. Não se vingar talvez seja a melhor vingança. Fazer esperar uma resposta que nunca virá.

(Fabrício Carpinejar)

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Confissão

Passei pelos dias com olhos ávidos em busca de coisas que queria dividir com você. Segui pelas ruas como se cada detalhe fosse uma notícia super importante para contar. Eu vi um carro capotado enquanto seguia para o aeroporto. Uma gorda muito gorda entalou na cadeira da praça de alimentação do shopping. A melhor amiga tá vivendo desventuras amorosas e a gente conversou sobre isso até muito tarde e dividiu esses sentimentos confusos-desconexos. Eu fui dormir com o telefone como companheiro na cama, ao meu lado, para o caso de. Nunca se sabe, né? Esperei ele tocar aquele alarme que mostraria seu nome no visor. Sonhei com a gente junto. Eu provei o vestido e me olhei no espelho querendo me enxergar pelos seus olhos. Será que diria "linda, linda!"? Eu senti aquilo tudo quando encontrei com quem me machucou e queria ter ligado para você chorando, aos soluços, para dizer o quanto doeu/dói em mim e pedir seu ombro com camisa reserva. Eu lembrei de tanta coisa dolorosa. Eu me entreguei aos meus impulsos consumistas e salve-se quem puder e que a Nossa Senhora dos Cartões de Crédito Estourados nos proteja. Eu quis ter você por perto e senti você tão longe. E quado você se afasta de mim, assim meio sem querer querendo, ausente presente, um pouco frio e ainda assim delicado, é que eu descubro o quanto você está intrincado em mim, na minha rotina, no meu dia, na minha vida. É justamente quando você se afasta que eu mais queria ter você presente. E eu sei que há esses momentos seus: reflexivos, reclusos, instrospectivos; e que eu simplesmente não consigo penetrar. Nessas horas, eu me calo, eu me preservo, eu me reservo, eu me ausento para respeitar. E, ainda assim, ainda que longe, ainda que calada, ainda que quietinha, ainda que ausente, tudo que eu mais queria era abraçar apertado e encostar minha cabeça no seu ombro para que o silêncio das coisas que não precisam ser ditas  fizesse seu trabalho e permitisse que meu coração batesse colado e no ritmo do seu.

domingo, 1 de maio de 2011

What about the news?

"We don't get to pick who we fall in love with, and it doesn't happen like it should." (No strings attached)