sexta-feira, 29 de abril de 2011

Amor bom

Amor bom, amor que pinta de azul o céu cinza dos problemas mais cascudos; amor que abraça porto seguro quando as lágrimas caem; amor daqueles que trazem flores para alma e eletricidade para o corpo; amor de fazer suspirar e marejar os olhos; amor que preenche a vida e envolve todos os sentidos; amor assim entrega-devoção-paixão; amor bom é amor difícil. É preciso que haja algumas dificuldades, um quiprocó, uma inquietação, uma aura de dúvida para que depois tudo dê certo no final e a paz que só o amor é capaz impere e a sensação de merecimento surja. Amor bom tem que ser lutado, conquistado, suado. Se vem simples, sem problemas, sem obstáculos, a gente desconfia, acreditando piamente no ditado popular que diz que "tudo que vem fácil, vai fácil". Amor bom tem que demorar para ter lugar, tem que ser decorrente de uma luta inglória que redima todos os pecados e exima as culpas vãs. Amor bom tem que ter lágrimas tolas, reconciliações instantâneas, pequenos desentendimentos que pareçam bombas atômicas na relação e que, no fundo, sejam apenas entreveros travados por dois corações que se querem demais. Amor bom é amor complicado, cujas discussões beirem a irracionalidade e cujas pazes aqueçam o coração, a alma, a vida e façam do inverno mais frio de todos os tempos o verão cearense. Amor bom é amor que dói para só então abrandar, que machuca para curar, que vem tsunami e depois se torna piscininha natural. Amor bom não pode chegar morno, mais ou menos, casual; tem que vir avalanche, inundação, curto-circuito dos sentidos, desacordo dos nervos. Tem que chegar amolecendo o corpo e cambaleando as pernas. Amor bom é aquele que derruba com um soprinho ao pé do ouvido as grades, os muros, as fortalezas de proteção que construímos em torno de nós mesmos. Amor bom é como quando se encontra a solução para um problema complicado de física quântica e então, todas aquelas incógnitas e operações matemáticas passam a fazer todo sentido e ele é simples, é muito claro, é muito óbvio: a gente está aqui é para isso mesmo, para amar.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Só uma palavra me devora: aquela que meu coração não diz.*

A ideia não é entender, mas sentir. Não é dar nome, classificar, enfileirar no rol disso ou daquilo outro, mas viver. A ideia não é obrigação, é prazer. A ideia não é cobrança, é querer. A ideia é beijo, ombro, abraço, mão... A ideia é se permitir. Até quando? Em que circunstâncias? Em que termos? Eu não sei nem quero saber.

Se eu fosse corajosa, bem resolvida, confiante, eu diria tudo que calo, tudo que entala na minha garganta por conta de um medo absurdo da rejeição. Se eu confiasse bem em mim, se minha auto estima ao menos existisse, eu contaria como eu me sinto, da sensação de derretimento, das minhas vontades impulsivas, dos meus desejos mais secretos. Se eu fosse outra mulher, em outras circunstâncias, talvez nem tivessem razão de ser essa insegurança que me assola e essas negações que me deprimem e essas vendas que me imponho pra controlar minhas explosões.

Eu sou só o que eu posso ser e você também. Humana demais para não sentir. Controlada demais para me jogar no abismo infinito. Carente demais para não querer. Envolvida demais para perceber. Fiquei tão soterrada nessa avalanche de sentimentos, nessa inundação, que demorei a recobrar o ar dos meus próprios pulmões e, ainda assim, eu não quero soltar sua mão. As incertezas que envolvem esse laço, as opiniões nem sempre estimulantes, os pequenos machucados cotidianos causados pelo não saber tão a fundo são muito pequenos perto da certeza que me impulsiona.

Não ter, não viver, não ver, não ouvir, não sentir certamente seria insuportável demais. Certeza de que tudo aquilo que se vê e se percebe é parte mínima do que efetivamente sinto. Certeza também de que poderia ser muito mais. Certeza também de que muitas águas ainda vão passar por baixo da ponte antes de se chegar na bifurcação do caminho em que será preciso decidir se tudo ou nada. Enquanto isso, segura minha mão.

*"Só uma coisa me entristece
O beijo de amor que não roubei
A jura secreta que não fiz
A briga de amor que não causei
Nada do que posso me alucina
Tanto quanto o que não fiz
Nada do que quero me suprime
De que por não saber ainda não quis
Só uma palavra me devora
Aquela que meu coração não diz
Só o que me cega, o que me faz
infeliz
É o brilho do olhar que não sofri"

(Jura Secreta - Zelia Duncan)

terça-feira, 26 de abril de 2011

Bem poderia ter sido escrito por mim

"Vem cá, deixe esse sol de lado, do lado de fora, longe de nós. Fecha essa cortina, esquece esse mar, me bastam as ondas de calor aqui dentro provocadas pelo teu olhar convidativo. Deixa esse papo de praia, a gente fica aqui, vamos brincar de infinito, vai ser só você e eu. A gente fica, pra gastar as horas do dia, debochar dessa tarde luminosa, embalados pelo "dolce far niente". Tem um despertador atrasado, uma agenda de folhas arrancadas, tem beijos intermináveis e dois corações com saudade de amar aqui dentro. Pra quê sair daqui? Esquece lá fora. O que tem se já passou do meio dia, se está tudo fora de lugar, se a gente esqueceu o pote do - agora ex sorvete - ao pé da cama, se só tem pizza gelada pro almoço, e se o almoço já virou jantar? Eu quero mais é que o tempo se arraste, que o sol se renda ao seu espetáculo mais bonito e o céu se encha de cores místicas entrando pelas frestas da janela, enfeitando nosso cenário, anunciando a chegada de uma noite certamente curta pra nós dois, que é quando percebo que eu preciso de mais de vinte e quatro horas diárias pra gastar contigo, eu preciso de mais ar pra respirar o bem que a tua companhia me faz. Mais suas mãos pelas minhas costas como promessas anti-estresse e mais memória pra eternizar suas expressões de décimas quintas intenções a cada movimento que faço brincando de dançar sem música, a cada pedido seu de que eu fale sobre meus planos para a madrugada anunciada por nossas mãos que não se descruzam um segundo sequer. Te digo, seriam dispensáveis palavras. No meio de um dia tão claro, o mundo parece parado quando você repousa os olhos nos meus, parecendo querer decorar os tons da minha íris, pondo o meu cabelo atrás da orelha, negando dizer o que pensa quando fica assim, só me olhando com o sorriso mais malemolente dessa estação de 40 graus escaldantes. E entre tantos e tantos beijos e olhares duradouros,  jurava que assim tão de perto, fosse certo, que estivesse entregue todas as minhas idéias pra nós dois. Sair pra quê, tá quente lá fora e melhor, bem melhor aqui dentro. Mas se eu preciso te falar, faço assim, musicada. Estico meus braços, alcanço teu som, aumento o volume e canto pra você o refrão de: "deixa o verão." Dispensáveis palavras. Minha boca calada, colada na sua, responde por mim: boicote ao verão. Então, deixa, deixa o verão, deixa o verão pra mais tarde."  (Yohana Sanfer)

segunda-feira, 25 de abril de 2011

"Mensagem de algo que ainda não sei"

"Então invadirias subitossuave a minha porta e me falarias de coisas tão caras a mim, feitas de frágeis, falsos encantamentos, como aquele botão de rosa branca que te dei faz algum tempo, e depois se abriu espantosamente, feito uma estrela, (...) nem eu nem tu saberíamos dizer de quem partiu o início do gesto, a mão de um tocaria redondaleve a pele do rosto do outro para que começasse a acontecer tudo aquilo de beijos e suores e salivas e gritos de prazer, misturados num sonho não sei se meu o teu/meu corpo que já não sabia até onde era meu ou teu, sentindo sempre, desde antes do início do gesto, de toque, que não haveria depois, e na manhã seguinte tonta, (...) atravessaria o dia meio cega para descobrir vagamente que, além de mentiras, terias deixado em mim a semente de uma história complicada (...) até enfim te concluir primário, tosco, terrês, nunca capaz de compreender que além desta nítida dor cravada que por muitas vezes beirou a morte, porque te queria como se quer, vadia, humanamente, deixavas também um encontro que não aconteceu, que talvez nada esclareça, porque tudo é de vidro, porque brotou da confusão apaixonada que despertasse em mim, que te julguei esclarecendo a vida, peça final de um quebra-cabeça, peça inicial de outro, de um excesso de líquidos e desejos para sempre incompletos, mas que ficará, ainda que ninguém a entenda, esses ramos, esses castelos, como não ficaste, porque eras só mensagem de algo que ainda não sei." (Caio F.)
 
PS: Só para constar: Caio Fernando Abreu, eu te amo!
 

domingo, 24 de abril de 2011

Desculpa

Eu quero pedir desculpas por ficar tão centrada na minha dor, tão focada no meu próprio umbigo, tão desconcertada e surpresa com o que me revirava por dentro, que esqueci de olhar para você com estes olhos de compaixão e solidariedade. Eu queria pedir desculpas pelo meu egoísmo, pela minha desatenção, pela minha miopia absurda, pela minha falta de sensibilidade em escutar o que doía em você também. Eu queria pedir desculpas por ser assim, intensa, impulsiva, destrambelhada e carente, tão perdida dentro de mim que passo por cima dos outros como um trator, como se a cruz que eu carrego, como se as correntes que arrasto fossem muito mais pesadas que as dos outros. Desculpa! A minha visão ficou turva, o meu coração se comprimiu, faltou o ar de novo e eu me perdi de mim, eu me afastei de você, eu não fiz o que deveria fazer, eu errei. Eu queria apenas que você soubesse que estou aqui sempre, que você também pode contar comigo, que eu também sou toda ouvidos para o seu desabafo, eu também sou um ombro amigo. Eu queria que você soubesse que nunca poderei agradecer todo o apoio, todo o carinho, mas eu sei que posso retribuir. E é por isso mesmo que peço desculpas agora, por ter sido descuidada. Desculpa...

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Se joga!

Quando a gente lembra no meio dia dia e um sorriso vem nos lábios. Quando a gente sente uma saudade gostosa, um desejo de voltar o tempo se não estiver mais perto ou de apertar o pause quando na presença. Quando a gente quer segurar a mão, deitar a cabeça no ombro, olhar nos olhos e deixar o tempo passar sem pressa. Quando a gente quer a companhia, quer o carinho, quer o beijo, quer a mão. Quando a gente quer só mais um pouquinho e sempre fica com um gostinho de quero mais. Quando nunca é suficiente, quando todo tempo do mundo parece curto, quando a vida fica mais bonita se se está junto. Quando se sente mais à vontade, quando se sente protegido e cuidado, quando não se entende direito, mas se sente profundamente. Quando não se sabe explicar, não se sabe como controlar, não se sabe como evitar, não se sabe como mensurar; mas sabe que está lá, palpitando dentro de si. Quando não há mais nada a fazer para evitar, para lutar, para se proteger, o jeito é se entregar, mergulhar de cabeça no redemoinho e desfrutar. Sem garantias, sem cauções, sem cuidado. Só entrega, só coração, só instinto. Vai, se joga!

terça-feira, 19 de abril de 2011

Desconexo

Acho que é preciso recuar, alguns passos para trás enfim...
É preciso que eu me tranque mais dentro de mim, sim
É preciso que eu escute um pouco mais o que estronda aqui dentro

Porque basta você deixar a porta semicerrada e então eu entro
É preciso que eu pare de observar para que eu enxergue menos perfeito
olho no olho, comida dada na boca, abraço que aperta e enche meu peito
barba que arranha, mão firme  que assanha e beijo quente que entontece
me estende a mão, me seca o corpo, me enxuga as lágrimas e me estremece

me observa com um sorriso de canto de boca e repete linda, linda!
me acolhe no ombro, me nina, me faz voltar a me sentir menina...
É preciso muito controle pra não me jogar nesse abismo que se abre

É possivel que eu, cética, crítica, racional e infame, ache muito tarde
Talvez seja exatamente pela aura que tinha ao redor do que eu enxergava
porque eu vi um destino final, um motivo para, uma razão que justificava
Porque eu construí sozinha, perdida, sofrida, uma história ideal
E agora, sem querer, eu preciso entrar em choque com o real
É preciso que eu seja menos impulsiva e pretensiosa
É preciso que eu seja desmemoriada e falaciosa
É preciso que eu arranque o que fez raiz em mim
Para que eu possa então enxergar melhor assim
Tô perdida, tô confusa, tá um caos nos meus porões internos
Eu queria seu amasso, seu abraço, seus regimentos eternos
Eu queria ser forte, ser inteira, eu queria não querer
Eu queria fácil, volátil, encaixe no viver
E, no entanto, conto o tempo no relógio, espero em esperança
Que todo o bem querer que me alcança e me afiança
Faça morada também no seu ser.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O que tem que ser, tem muita força

Nem sei se acredito em destino, nem sei se minha banda toca nessa vibe de o-que-tem-que-ser-será; mas eu acho mesmo que as coisas acabam se encaminhando e a gente não pode se assustar com as dificuldades todas que a vida nos impõe. É preciso coragem para ser feliz, para abrir a porta de si e deixar a sorte entrar, para viver um grande amor e para arriscar. É preciso força para acreditar quando não houver esperanças, para persistir na luta quando se estiver exaurido fisicamente. É preciso querer mais, além do que se vê, além do que é obvio. É preciso saber reconhecer o que é de verdade, separar o que é raiz profunda do que é banal, superficial e, só naqueles, investir. Às vezes, a gente se confunde. Às vezes, a gente mete os pés pelas mãos. Às vezes, a vista fica embotada e o radar meio confuso, a gente vai operando por aparelhos, seguindo instintos (primitivos até) e sobrevive. E cambaleando e inseguro, descobre, lá na frente, que sim, tem muita coisa boa esperando pela gente, basta a porta se abrir. Porque o que tem que ser, meus amigos, persiste batendo na porta. O que tem força, não foge à luta. O que é verdadeiro, permanece estampado onde quer que a gente se esconda. Nisso eu acredito: o que tem quer ser, tem muita força.
 
"E tem gente maravilhosa que, de repente, vai ficando longe, difícil de ver – e aí dança. Mas também acho que aquilo que é bom, e de verdade, e forte, e importante – coisa ou pessoa – na sua vida, isso não se perde. E aí lembro de Guimarães Rosa, quando dizia que "o que tem de ser, tem muita força". A gente não tem é que se assustar com as distâncias e os afastamentos que pintam."  (Caio F. Abreu)

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Com um turuturuturuturuturuturutu

Há expectativa, ansiedade, revoada de borboletas na barriga... Já roí as unhas e as cutículas e o dedo inteiro, já senti dor de barriga (característica fundamental dos meus momentos de tensão). Quase não consigo dormir e acordei tomando um susto daqueles. Tudo pronto, embalado, arrumado, esperando só a hora certa de partir. E o tempo passa de ré nesses momentos, porque, para cada segundo que o ponteiro avança, na minha cabeça, ele volta dois. E assim, o tempo se arrasta sem sair do lugar. 8:05... 8:05... 8:05... E não vira, não anda, não passa. Vai logo, quinta-feira, para o momento de acalmar esse turuturuturuturutu do meu coração, de segurar firme a minha mão, de abraçar apertado... 8:09... 8:09... Passa rapidinho tempo rei, mas quando eu chegar lá, pode se demorar, pode descansar da corrida, pode até parar um instante para nós. Deixa a vida me presentear com essas surpresas, deixa eu curtir meu céu azul, deixa, vai! "Tempo, tempo, mano velho, brinque comigo, seja legal, conto contigo pela madrugada..."

terça-feira, 12 de abril de 2011

Capisce?

Cair em tentação? Acho mesmo muito errado! Na tentação não se cai, se mergulha. Até o fundo. Só assim fazemos a culpa valer a pena.

(Andrea Beheregaray)
 

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Não se pode ter paz evitando a vida

Às vezes, na estranha tentativa de nos defendermos da suposta visita da dor, soltamos os cães. Apagamos as luzes. Fechamos as cortinas. Trancamos as portas com chaves, cadeados e medos. Ficamos quietinhos, poucos movimentos, nesse lugar escuro e pouco arejado, pra vida não desconfiar que estamos em casa. A encrenca é que, ao nos protegermos tanto da possibilidade da dor, acabamos nos protegendo também da possibilidade de lindas alegrias. Impossível saber o que a vida pode nos trazer a qualquer instante, não há como adivinhar se fugirmos do contato com ela, se não abrirmos a porta. Não há como adivinhar e, se é isso que nos assusta tanto, é isso também que nos dá esperança.

É maravilhoso quando conseguimos soltar um pouco o nosso medo e passamos a desfrutar a preciosa oportunidade de viver com o coração aberto, capaz de sentir a textura de cada experiência, no tempo de cada uma. Sem estarmos enclausurados em nós mesmos, é certo que aumentamos as chances de sentir um monte de coisas, agradáveis ou não, mas o melhor de tudo, é que aumentamos as chances de sentir que estamos vivos. Podemos demorar bastante para perceber o óbvio: coração fechado já é dor, por natureza, e não garante nada, além de aperto e emoções mofadas. Como bem disse Virginia Woolf, "não se pode ter paz evitando a vida."
 
(Ana Jácomo)
 
E eu, impulsiva, urgente, me jogando, como sou, vou ali e escancaro as portas, abro as janelas, quebro os cadeados. Eu perdi o medo da dor e vivo com o coração aberto, tentando sentir intensamente cada experiência. Eu quero mesmo é me sentir viva!
 
Enfim, essa semana chegou.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Solidariedade

Quando a gente perde alguém de repente, a gente não consegue mais ser insensível à dor de ninguém. Foi assim que assistindo à TV de ontem para hoje, vendo as cenas chocantes do que se passou naquela escola, que eu comecei a sentir de novo a angústia de quem perde alguém para a morte de repente. É uma angústia de quem não teve tempo de se despedir, de se preparar. Angústia de quem, até pouco tempo antes, contava com aquela pessoa na vida por muito tempo. É um aperto no peito, uma sensação de impotência, um desespero.
 
Vi a cena de uma mãe que pulava e gritava ao receber a notícia da morte do filho e entendo. Entendo porque eu sei que a sensação é de que a dor não cabe dentro, de que o corpo vai explodir e se tornar milhares de pedaços espalhados pelo chão. A sensação é insuportável, o vazio, o buraco são muito maiores do que se é capaz de conceber. O que grita por dentro é ensurdecedor e o grito da mãe, o choro convulsivo, a sensação de desfalecimento, acreditem, é mínima perto do que realmente se sente.
 
Eu assisto estarrecida ao noticiário nacional e passo mal, choro também, choro pelas vidas partidas, pelas famílias destruídas, pela dor dos outros que é minha também. Eu revejo as cenas e me revolto com essa fragilidade, com a atrocidade e com a loucura do indivíduo. Eu olho para TV e, entre as lágrimas do meu pranto silencioso, eu me reconheço naqueles rostos curtidos pela dor. Eu não sei mais ficar indiferente e sofro.
 
Não dá, não deu para não falar disso. E, apesar desse blog ter por objeto os melhores momentos da minha vida, hoje o dia amanheceu cinza dentro de mim.

 

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Conselhos Clariceanos

Eu sou péssima pra elaborar estratégias. Péssima para utilizar máscaras. É fato que o que transparece, via de regra, é uma mínima parte do que existe. Mas eu não sei mentir. Sou sempre traída pela intensidade que me move, pelo olhar que revela e até por atitudes que eu tomo de maneira insensata, na base do impulso.

Descobri que detesto ficar naquele joguinho de gato e rato em que a gente não diz o que quer dizer, não demonstra o que sente, está a fim de ligar e não liga porque pode ser que o outro pense isso ou aquilo, assim ou assado. Acho que cansei desses recursos juvenis de conquista e prefiro sempre a verdade, o inequívoco e dou (muito) a cara pra bater.

Deve ser também porque desisti de perder meu tempo com pormenores e, em se tratando de relacionamento, eu acredito mesmo que não há meio termo. A gente sabe desde o príncípio o que quer e sabe também da reciprocidade. Por mais que, em algum momento, as coisas estejam confusas, embaralhadas, há sempre um pressentimento que revela o que parece obscuro.

Há quem persista, há quem fique dando murro em ponta de faca, batendo cabeça na parede e insistindo, insistindo, insistindo. Eu não. Eu só vou se o caminho for de mão dupla. Eu só prossigo se me sentir segura e querida. Eu só continuo se, e somente se, houver reciprocidade. Se eu começo a duvidar, eu recuo. Se algo me angustia, eu recuo. Se há concorrênia, eu recuo. Se eu não vejo sinceridade, reciprocidade, exclusividade, respeito, carinho, eu caio fora. Fácil.

Não se trata de ser leviana, displicente com as possibilidades, fria ou qualquer coisa que o valha. É que eu não quero mais viver presa a nada que possa dar errado. E concordo com Clarice, quando diz que de nada adianta esforços inúteis porque o amor nasce espontaneamente e, se tudo foi feito para conquistar o amor, e ele não veio, o que resta é não fazer mais nada.

"Quando fazemos tudo para que nos amem e não conseguimos, resta-nos um último recurso: não fazer mais nada. Por isso, digo, quando não obtivermos o amor, o afeto ou a ternura que havíamos solicitado, melhor será desistirmos e procurar mais adiante os sentimentos que nos negaram. Não fazer esforços inúteis, pois o amor nasce, ou não, espontaneamente, mas nunca por força de imposição. Às vezes, é inútil esforçar-se demais, nada se consegue;outras vezes, nada damos e o amor se rende aos nossos pés. Os sentimentos são sempre uma surpresa. Nunca foram uma caridade mendigada, uma compaixão ou um favor concedido. Quase sempre amamos a quem nos ama mal, e desprezamos quem melhor nos quer. Assim, repito, quando tivermos feito tudo para conseguir um amor, e falhado, resta-nos um só caminho... o de mais nada fazer." (Clarice Lispector)

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Assim

Há essa ansiedade palpitando na minha alma, essa vontade urgente que faz com que cada poro da pele deseje o toque quente e preciso. Há um bater sem ritmo do coração e a sensação de que as pernas não respondem direito aos comandos cerebrais quando a voz sussurra em detalhes todas as intenções. Há um desejo contido à força, como uma represa pronta para jorrar e para ocupar cada milímetro do espaço entre os dois. Há essa força queimando por dentro, fazendo com que o corpo inteiro vibre numa sintonia nova e completamente desconhecida. Há esse filme em flashback e há essa gravação de áudio que, vez em quando, acelera e desacelara descoordenadamente a respiração e causam essas vertigens, tonturas, molezas inexplicáveis. Há uma confusão na mente e não há o mínimo interesse em frear anseio, desejo, vontade, querer algum. Há uma certa taquicardia e algumas centenas de milhares de borboletas fazendo revoada bem no centro do estômago. Há um pressentimento bom de que o melhor está por vir. E diante desse cataclisma de sentimentos, diante do sexto sentido que impele, diante da delícia que é sentir, não há razão, conselho, pé no chão, plausibilidade que impere.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Eu sei

"Sabe rir mole de bobeira? Sabe dançar idiota de alegria? Sabe dormir gemendo de saudade? Sabe tomar banho sorrindo para a sua pele? Sabe cantar bem alto para o mundo entender? Sabe se achar bonita mesmo de pijama e olheiras? Sabe ter ânsia de vômito segundos antes de vê-lo e ter fome de mundo segundos depois de abraçá-lo? Sabe não agüentar? Sabe sobrevoar o frio, o cinza, os medos, os erros e tudo que pode dar errado? Ele consegue fazer com que eu me perdoe por apenas viver sem questionar tanto." (Tati Bernardi)


segunda-feira, 4 de abril de 2011

Sobre o que a gente só sabe sentir.

É como o primeiro dia de férias, quando a gente acorda sobressaltada achando que perdeu a hora e relaxa entendendo que não, que nem precisa levantar. É como se, a cada encontro furtivo, ficasse a sensação de que se tem todo tempo do mundo, mesmo sem ter. É como se o tempo parasse no instante em que o olho de um alcançasse o outro. É como um fim de semana inteiro de "dolce far niente", esparramado na cama, com uma preguiça gostosa de sentir. É uma paz no coração, é uma leveza na alma, é um gostinho doce e bom que demora a sair da boca. É a sensação de pertencer, de estar em casa, de poder dividir qualquer coisa: a que dói mais, a que envergonha mais e a que arranca gargalhadas também. É vontade de mais, muito mais. É ansiedade pelo encontro, pelo abraço apertado, pelo beijo demorado, pelo ombro, pela mão. É um querer para ontem. Não, para antes de ontem. Assim mesmo: urgente, intenso, viciante, como só as melhores coisas são capazes de ser. É sentir carinho na voz, é sentir muito perto, é construir intimidade, ainda que alguns milhares de quilômetros distancie. É investir pesado na imaginação, é verborragia, é viver sem fronteiras e, mesmo assim, sentir fisicamente o peso da falta. É se sentir impotente muitas vezes e doer por não poder segurar a mão em silêncio. São palavras que piscam no monitor e no visor e fazem o coração sair do ritmo. É presença, é rotina, é companhia, é o melhor de cada dia. É saudade, amizade, contagem regressiva, dengo. É o tipo de coisa que é difícil definir, é difícil de explicar, mas que a gente sabe desde sempre sentir.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Antagônico

Eu simplesmente não me importo. Viveria tranquilamente sem sua presença na minha vida. Não fico pateticamente carregando o celular na mão para todos os lados, esperando seu nome aparecer no visor. Não acompanho as horas do dia passarem, imaginando a sua rotina. Não espero o celular vibrar anunciando o SMS que me mandou. Não adoro ouvir a música que escolhi para ser seu toque. Não foi intensa a forma como caímos de paraquedas um na vida do outro, assim como não fez (nem faz) a menor diferença no meu cotidiano a sua companhia. Não sinto sua falta. Não fecho os olhos e imagino como foi, como é, como será. Não há saudade alguma do que passou e do que virá. Não vejo nada de especial na forma como a gente interage e, sabe, nem há expectativa alguma nessa relação. É só mais um ponto de apoio para fazer o tempo passar mais rápido. É isso mesmo: um passatempo, uma distração. Não sei nada sobre você, não quero saber, não quero ser íntima nem estar à vontade ao seu lado. Não quero contato, não quer entrelaçamento, não quero segurar sua mão. Pouco importam seus problemas, seus desafios e seus leões de cada dia. É totalmente insignificante seu passado, sua história e sua vida. Entro e saio, vivo e danço, ando pelo mundo sem sequer lembrar que você existe. Não é meu primeiro pensamento do dia. Não é meu último suspiro antes de dormir. Não me faz querer ligar quando qualquer coisa acontece, no meio do dia, no meio da noite. Não me dá essa vontade impotente de estar mais perto, de estar ao lado, de abraço apertado. Não me dá essa ânsia de apenas estar no mesmo lugar que você. Não me tira do chão, não me faz sonhar, não me causa arrepios, espasmos, nem me faz perder o ar. Não é bom, não é surreal, não é nada demais, afinal. É só um tictac marcado, só palavras ao vento, só um burburinho no meu silêncio. Não é nada. Nem existe. Mas só é desse jeito porque hoje é primeiro de abril e eu sei mentir, como poucos, quando é para falar do que sinto.