quinta-feira, 31 de março de 2011

Num é?

Ela quer atitudes, ele quer ela. Todas as noites ela pensa nele, e todas as manhãs ele pensa nela. E assim vão vivendo até quando a vontade de estar com outro for maior do que os outros. Enquanto o mundo vive lá fora, dentro de cada um tem um pedaço do outro. E mesmo sorrindo por aí, cada um sabe a falta que o outro faz.
 
Nunca mais se viram, nunca mais se tocaram e nunca mais serão os mesmos. É fácil porque os dias passam rápido demais, é difícil porque o sentimento fica, vai ficando e permanece dentro deles. E todos os dias ele se perguntam o que fazer. E imaginam os abraços, as noites com dores nas costas esquecidas pelo primeiro sorriso do outro. E que no momento certo se reencontrem e que nada, nada seja por acaso.
 
(Tati Bernardi)

quarta-feira, 30 de março de 2011

Eu quero todo tempo do mundo

"O tempo entrega a verdade. O tempo tira as máscaras. E você começa a reparar que a barriga dele está crescendo, a perna dela tem veias, ele se veste mal, ela sua no bigode. Começar a reparar numa celulite, numa preguiça para o banho. A se cansar do excesso de queixas, do excesso de carinho, de carência, do excesso de choro, de dias mal humorados. Ele arrota muito. Ela deixa o sapato na sala. Estraga comida. É pirangueiro. Tem chulé. Então você descobre que não quer viver o resto da vida com essa pessoa. E o erro é seu: você queria um amor cego.

Mas o amor não é cego. Ele é tudo, menos cego. O amor rochedo - aquele que, ao invés de dar inveja, dá esperança - enxerga tudo de ruim. E continua existindo. Existindo com estria, com ronco. Existindo com pagode, sertanejo. Existindo com bafo. Com peido. Com desculpas para não transar. O amor existe com dívidas, com liseu, sem férias. E mais: ele só existe, ele só acontece, quando os dois conseguem tirar as suas máscaras. Vai ver, sei lá, que ele só existe depois de 20, 30 anos."

 
FROM: http://elessabemdemais.blogspot.com/
 
E eu quero apenas tempo para descobrir isso, para testar a teoria, para experimentar o corroer e para tentar criar alternativas para viver o amor rochedo. Porque eu acredito mesmo que o tempo só destrói o que é frágil, o que é trôpego, o que é destrutível. Aquilo que é união com reciprocidade, via de mão dupla, vai e volta com a mesma força e intensidade, é rocha, é nó de marinheiro, é indissolúvel, é indestrutível. Eu não tive tempo de comprovar. E é só isso que eu quero para a próxima vez: TEMPO. Todo tempo do mundo.

terça-feira, 29 de março de 2011

Inescapável

Nessa brincadeira de esconder e mostrar, de fingir e falar, de omitir e contar, a gente vai fazendo curvas na razão e embotando a visão. Nessa tentativa vã de não se expor tanto, de proteger o que é mais frágil, de não transparecer o que explode, a gente vai dando nós na sensibilidade e escondendo as evidências. Nessa jornada tola e contraditória de querer não querer, de sentir sem sentir, de viver sem viver; a gente vai se agarrando aos quases, aos mínimos, aos pequenos sinais. Gastamos energia e tempo, perdemos momentos e palavras, desperdiçamos afeto e ternura no esforço hercúleo de esconder. Somos traídos pela ebulição do que é óbvio, pelo transbordamento dos containers internos, pela saturação da dúvida. Pleonasmo vicioso salta aos olhos e o que é fogo queima, o que é água jorra, o que é vento venta e não deixa mais nada em seu devido lugar. Tudo apenas para mostrar que não se esconde, não se finge, não se omite, não há como proteger o coração do que ele sente. É o que é e se queda, com mãos e pernas atadas e fita adesiva na boca, a razão.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Por que não?

E se vier assim de leve, sem pesos ou amarras, sem assinaturas e expectativas, sem promessas e sem cobranças, sem termos de compromisso e sem submissão? E se vier assim sorrindo, oferecendo ombro e carinho, dando atenção e apoio, causando espasmos e aquecendo a alma? E se vier assim intenso, fazendo cambalear as pernas, cansando a mente com flash-backs, acendendo tochas de fogo onde antes era frio e escuridão? E se vier assim de repente, trazendo mais do que se pedira, surpreendendo mais que a expectativa e caminhando como que se acompanhasse a música do coração? Se chegasse fazendo cosquinhas no coração, preenchendo vazios e dividindo os pesos, soprando os arranhões e suturando feridas, fazendo mais fácil o que era insuportável? Se aparecer assim de repente, quando menos se esperava, quando a página já estava quase virada, e nem se tinha mais a intenção? Se conseguir mudar o tempo, fazer céu azul na vida, trazer raios de sol à rotina? Por que não? Por que não?

domingo, 27 de março de 2011

Sobre merecimento

Muitas coisas bacanas aconteceram na minha vida desde o janeiro trágico, quando tudo ficara de cabeça para baixo. Não vou repetir aqui tudo que contei lá no Não quero merecer outro lugar, mas é fato que, no meio do pior de todos os momentos, eu encontrei e recebi muitos motivos para sorrir. E por isso e por muitas outras coisas, eu costumo dizer que o que há de melhor nessa vida são as pessoas que a gente conquista.

Aí que dia desses, alguém que também está vivendo uma situação delicada, bem diferente da que eu passei, mas não menos dolorosa, veio me dizer que preferia passar pela dor da morte a conviver com o imbróglio em que se metera, disse que a dor dela era muito maior, disse que as circunstâncias no caso dela eram muito piores e, a tacada final, disse que eu tinha muita sorte pelas coisas boas que me aconteceram e vem acontecendo, porque eu nem fazia por onde, eu nem rezava, nem tinha fé em Deus.

Na hora, eu nem me choquei muito com as palavras, fiquei mais tentando dar uma força, porque entendo que seja normal, quando se está no olho do furacão, não se ter visão periférica. A gente enxerga só o que é nosso, o que dói pungentemente dentro da gente, o que mais parece insuportável, intransponível. Passado algum tempo, eu fui refletir sobre o que me foi dito e acabei caindo nas garras da ideia do merecimento e, então, veio uma avalanche de sentimentos conflitantes e distorcidos.

Eu merecia passar pelo que passei pelo simples fato de não acreditar, até então, em Deus? É culpa minha ter de ver meus filhos crescerem sem o carinho, o exemplo, o afeto, o apoio do pai mais amoroso que eu já vi? Eu mereço o carinho e a solidariedade de tanta gente que me cerca e me envolve num cobertor humano? Eu mereço que gente querida cuide de mim de perto e de longe e não permita que eu me sinta sozinha? Eu mereço coisas boas, mesmo sendo quem eu sou, cética, descrente? E, pensando pelo lado contrário, quer dizer então que é só fazer a tarefa de casa religiosa que estaremos imunes ao sofrimento e à dor?

Fiquei uns dias ruminando essas questões dentro de mim. Confesso que muitas vezes me senti culpada por ser feliz na maior parte dos momentos. Desabafei com alguns e, mesmo sem encontrar resposta, mesmo sem entender porque tanta coisa boa me aconteceu na vida, antes e depois do janeiro trágico, mesmo sem saber direito se se trata mesmo de merecimento ou escolhas acertadas, eu decidi não sentir culpa e viver.

Eu não posso mudar a história da minha vida, mas escolho somente o que me faz bem. Eu não posso convencer a pessoa que implantou essa dúvida na minha cabeça de que não se pode comparar dor, mas posso fazê-la constatar que o que difere nossas situações é a absoluta irreversibilidade da morte. Eu não posso fazer com que coisas tão boas aconteçam na vida dela, mas posso torcer por isso. Eu não tenho como repassar pra ela o carinho que as pessoas tem por mim, mas eu posso ser carinhosa e solidária com ela. Eu não sei se mereço, eu não sei nem se é essa a questão, mas eu sei que eu vivo, com coragem para seguir em frente, com vontade de ser ainda muito feliz, e agradeço sempre.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Desejo

Que a dor que a gente carrega nunca se transforme em mágoa, em rancor, em destemperança. Que aqueles que nos feriram nunca sejam feridos do mesmo modo. Que o mal que nos acomete seja único e excepcional. Que as pancadas sofridas não virem azedume. Que a esperança seja perene, persistente, eterna, presente. Que os sorrisos sejam em maior número que as lágrimas. Que as borboletas sejam diárias e que tragam sorrisos. Que as emoções sejam felizes e que carreguem consigo vontade de quero mais. Que haja sempre pessoas por perto, de mãos dadas, ombros amigos, colos confortáveis, beijos e afagos. Que não falte prazer em rir, em viver, em amar. Que todos os dias sejam vistos como uma nova oportunidade, uma página em branco, uma chance a mais. Que as surpresas sejam sempre boas. Que a paz faça do coração um reduto permanente. Que haja calma, tranquilidade e alegria na rotina. Que os dias sejam permeados por pequenos gestos de carinho. Que a saudade não seja dolorida, que ela faça tão somente cosquinha no coração pelo que se foi vivido, muito bem vivido. Que haja sempre um cantinho de aconchego. Que haja um corpo que aqueça a alma. Que haja uma boca para beijar. Que haja um abraço beeeem apertado a dar. Que haja gente para compartilhar alegria e amparar as lágrimas. Que haja sempre, pelo menos, um motivo de orgulho por ser quem se é e isso seja capaz de justificar sua existência inteira. Que, mesmo nos dias mais difíceis, ainda se encontre centenas de razões para recomeçar. Que a tristeza e a solidão não sejam a principal companhia. Que nos dias mais tristes uma criança gargalhe por perto ou apareça um arco-íris no céu. Que pequenos gestos sejam capazes de criar a compreensão da dádiva que é viver. Que se encontre a felicidade mais completa nas coisas mais simples. Que se saiba que realizar sonhos é o objetivo de se estar aqui. Que se entenda que é temporário, que é efêmero, que é finito. Que se perceba uma ótima oportunidade e não a desperdice. Que se saiba amar com força, com entrega, com paixão, com profundidade, com tudo que se é capaz de dar. Que se doe a si, à vida, aos filhos, aos outros. Que se ame sem medo, sem reservas, sem pés atrás. Que se viva inteiramente. Só assim.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Conectividade

A noite já se revirava querendo virar dia, a lua já ia alta há muito, o silêncio tomava conta da escuridão, mas havia essa conexão, ligando dois seres em espaços tão distantes, mas cujas mentes estavam unidas em algum lugar irreal que só existiria para eles dois. Havia esses peitos arfantes, havia essa comunhão de pensamentos, havia esse enleio de corpos sem controle ocupantes de lugares bem afastados no espaço, havia interesse mútuo e essa urgência de explodir em palavras aquilo que não se conseguia mais guardar em pensamento. E o mundo rodopiava, e o corpo dançava, e a realidade embaçava, no tempo-espaço em que aquelas sensações envolviam eles dois. Horas a fio, as frases pairando no ar e nas mentes, a imaginação como corrente, a eletricidade a turbinar. O tempo parecia estacionar no universo imaginativo deles dois e em transe, em pause, sem pressa ele volta a correr depois.

terça-feira, 22 de março de 2011

Minhas emoções são pálidas

Eu tenho essa mania de esconder e controlar as explosões que acontecem em mim. Meus sentimentos ficam escondidos nos recônditos mais profundos dos meus porões internos e aquilo que se vê, aquilo que transborda é tão somente uma mínima parte da imensidão que carrego comigo. Se me virem chorar aos soluços, acreditem, a dor é muito maior. Se me virem abraçar com carinho, acreditem, a ternura é muito maior. Se me ouvirem confessar sentimentos, acreditem, aqui dentro nem cabe mais de tão imenso. O que sai de mim é muito pouco se comparado ao que eu efetivamente sinto. E, assim, quando dói, quando eu acho que vou sucumbir de tanta dor, eu também controlo tudo dentro de mim e, vezenquando, passo por fria, simplesmente porque me mantive estática.

Esse poema fala muito sobre mim e é meu preferido há muitos, muitos, muitos anos. Nem lembro quando li a primeira vez, mas vem hoje ilustrar a minha parcimônia na lida com o que quer entrar em erupção.

Renúncia
              
Me mantive branca,
Me mantive estática;
No entanto uma chama
De paixão estranha
Ardeu dentro em mim.
Mas ele não soube,
Nem saberá nunca,
Tudo que senti...

Vi mundos nublados,
Me aromei de nardos,
Me tremia o peito...
E em meu porte erguido,
Me mantive estática,
Minha emoção foi pálida...
Já passou o momento,
Foi-se a tempestade.

Não saberá ele
Que senti seus lábios
Beijar minha carne;
Que ao fitar nos seus
Meus olhos profundos,
Entreguei minh'alma;
Que tremi de anelos,
Juntando nas minhas
As suas mãos cálidas

Mas passou o momento
Como tudo passa,
E entre labaredas
Desse fogo imenso
Me mantive estática,
Me mantive branca.

Tu sábio e grandioso
Senhor do Universo,
Tu, sim, é que o sabes;
Te entrego este grave
Instante que redime
Meus pecados todos;
Guarda o meu segredo,
Que ele nunca saiba
Isto que tu sabes.

(Manuel Bandeira: Poemas traduzidos, in: Estrela da Vida Inteira)

segunda-feira, 21 de março de 2011

Inundação

Num dia de março, eu vi as comportas da represa serem abertas e assisti a inundação ocorrer. Pensava que o mundo não seria mais o mesmo depois disso, depois de ver a água invandir cada canto, cada espaço. Acreditei que a destruição seria profícua, apostei que cada muro que caíra era para ver nascer uma vasta e ampla paisagem.

Eu acompanhei a força da natureza invadindo e destruindo tudo que era forte construção. Eu observei meio estarrecida e com frio na barriga o tombar de árvores centenárias, com suas raízes flutuando, o cair de casas milenares, o destroçar de uma cidade inteira engolida pelo que não podia mais ser represado.

Depois de serenadas as águas, subi até o ponto mais alto da mais alta montanha para admirar em que aquela paisagem se transformara. Era preciso aquele silêncio e aquela paz, era preciso ter de novo com aquelas recordações, era preciso dessa distância, sem acesso, sem sinal, era preciso a falta de tudo para então reconhecer o que de fato se tinha.

E aí, as coisas surgiram como que reveladas por inspiração divina, como se já estivessem há muito dentro do meu coração, como se pousadas ali antes mesmo da inundação. Ficou muito óbvio o descompasso e a reviravolta. A paisagem continua linda e atraente e todas as aspirações dela continuam submersas naquelas águas. Mas não se tem como brigar contra a força do impossível. Ela olha para o horizonte e só vê a inundação que não pôde evitar, que não soube conter. Não há como voltar atrás.

E a paisagem nunca mais será a mesma.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Aula de matemática

Sabe aqueles problemas matemáticos, em que, pela análise do texto, somos obrigado a formar equações e, finalmente, descobrir os valores das incógnitas? Pois bem, cruzar as vidas das pessoas é parecido com ir formando equações matemáticas. Elas podem ser simples e de resultado dedutível. Podem ser de segundo grau, com variáveis mais complexas e cálculos mais elaborados. Podem envolver resultados de equações anteriores e, por isso mesmo, ter seu resultado diferido, postergado; posto que fica na dependência de resolvermos questões anteriores.

Engraçado é que algumas equações que formamos nesse entrelaçamento de vidas, por mais complexas, por mais irracionais que sejam os números envolvidos, por mais casas decimais e frações que existam, a gente bate o olho e percebe claramente que o resultado será um número inteiro e positivo. Não se sabe de antemão a que processos submeter para decifrar a incógnita envolvida na questão, mas a gente pressente o resultado e sabe que vai alcançá-lo.

Uma das mais difíceis lições que tive na escola foi aprender matemática. Meu negócio sempre foi as palavras, nada de números. Agradeci muito quando entrei na Faculdade de Direito por não ter mais que lidar com eles e respondia até com um certo desdém quando meus amigos calculadores me diziam que eu só saberia, a partir de então, calcular dez por cento. Hoje eu percebo claramente o quanto a matemática está intrinsecamente relacionada à minha vida e fico aqui, cruzando os dedos, para que a resolução da equação com resultado diferido seja mais fácil do que imagino e chegue logo.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Para "Pouco açúcar e muito sal"

E daí se a gente pressente que vai se esborrachar? E daí que agora se trata apenas de medidas paliativas para diminuir a gravidade do resultado? E daí que pensem que foi suicídio, que foi intencional? E daí? Melhor isso que uma vida morna. Melhor arriscar que nunca saber como seria se. Melhor apostar que ficar o resto da vida pensando no que poderia ter sido. Arrependimento porque não teve coragem, arrependimento porque não foi lá e fez. Quebrar a cara é o menor dos males ante as milhares de possibilidades que a vida nos oferta diariamente. É triste quando não se sabe ver. É triste quando não se sabe viver. É triste quando não se percebe. Vai no espelho d'água de cabeça! Pensa como eu pensei: na pior das hipóteses, é história de vida. Imagine agora a melhor!

terça-feira, 15 de março de 2011

Será?

Normalmente, o amor vem carregado de pendências e acessórios não previstos, com um enredo muito diferente dos filmes e romances. E surgem os dilemas. Aceitá-lo ou não? Abrir ou fechar a porta? Ficar na janela ou ir brincar lá fora? O que fazer com estas pedras? A razão nos leva a percorrer esta tortuosa e dilacerante estrada de dúvidas, que na realidade não nos leva a lugar algum, porque o amor é uma via de uma mão só. Uma vez nela, não nos é mais possível dar a ré.
 
(From: Blog 3x30)

segunda-feira, 14 de março de 2011

Conta pra mim, vai!

Conta pra mim de onde a gente se conhece. De onde vem a sensação de que sempre esteve aqui, quando eu sei que não estava. Conta por que nada do que diz sobre você me parece novidade (...). Conta onde nasce essa familiaridade toda com os seus olhos. Onde nasce a facilidade para ouvir a música de cada um dos seus sorrisos. Onde nasce essa compreensão das coisas que revela quando cala. Conta de onde vem a intuição da sua existência em minha vida um segundo depois de termos nos encontrado.

Conta pra mim de onde a gente se conhece. De onde vem o sentimento de que a nossa história, absolutamente nova, é como um livro que releio aos poucos e, ao longo das páginas, apenas recordo trechos que esqueci. Conta de onde vem a sensação de que nos conhecemos muito mais do que imaginamos. De que ouvimos muito além do que dizemos. (...) Conta de onde vem essa vontade que parece tão antiga de que os pássaros cantem perto da sua janela quando cada manhã acorda. De onde vem essa prece que repito a cada noite, como se a fizesse desde sempre, para que todo dia seu possa dormir em paz.

Conta pra mim de onde a gente se conhece. De onde vem essa repentina admiração tão perene. De onde vem o sentimento de que nossas almas dialogam (...). Conta porque tudo o que é precioso no seu mundo me parece que sempre foi também no meu. De onde vem esse bem-querer assim tão fácil, assim tão fluido, assim tão puro. Conta de onde vem essa certeza de que, de alguma maneira, a minha vida e a sua seguirão próximas.

Conta pra mim por que, por mais que a gente viva, essas coisas nos surpreendem tanto toda vez que vêm à tona.
 
(Ana Jácomo - Com adaptações)

domingo, 13 de março de 2011

Tudo certo


E quando não se consegue mais expressar o que vem de dentro, e quando a gente não consegue mais encontrar as palavras mais adequadas, e quando não se consegue deixar evidente, e quando nem se conseguiu organizar os sentimentos que vieram em turbilhão, e quando não se sabe se está se fazendo entender nas inúmeras e intermináveis conversas, e quando tudo que se quer é que seja percebido pelo interlocutor a importância do momento, e quando não dá mais pra manter dentro, e em muitas outras ocasiões, as músicas falam pela gente.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Muito mais

Ainda sinto a revoada de borboletas que senti antes de encontrar. Ainda estou rindo do garçom que perguntou se a pizza era com queijo "brito". Ainda sinto a brisa do mar da Praia de Iracema. Ainda vejo as lágrimas caindo. Ainda sinto o abraço apertado. Ainda sinto o gosto do carangueijo e nem me arrependo de ter entregado a patona mais carnuda. Ainda sinto o sol nas minhas costas, torrando a minha pele. Ainda sinto vontade de rir e de pular na piscina. Ainda sinto o gosto da tapioca de carangueijo e da pizza de lombinho com mango chutney. Ainda sinto o burburinho dos meus amigos e relembro os comentários deles. Ainda sinto o tumtumtum do coração. Ainda sinto o abraço apertado. Ainda desfaleço e embaralho os sentidos. Ainda lembro do susto ao perceber o nascer do sol. Ainda escuto a voz doce da Roberta Sá entoando melodias conhecidas. Ainda sinto ímpetos de mais perto. Ainda sinto os pingos da chuva e a roupa molhada. Ainda sinto o abraço apertado. Ainda escuto a voz em meus ouvidos. Ainda tenho imagens mnemônicas. Ainda sinto vertigens. Ainda desfaleço e embaralho os sentidos. Ainda lembro do susto ao perceber o nascer do sol. Ainda sinto o cheiro. Ainda repasso como um filme os momentos no parque. Ainda vibro com o entrosamento. Ainda sinto a paz, o aconchego, a doçura e a sensação de pertencimento no cinema. Ainda sinto a vergonha por ter dinheiro e não ter como pagar. Ainda relaxo com a massagem. Ainda adormeço com a lembrança do ombro. Ainda sinto o abraço apertado. Ainda desfaleço e embaralho os sentidos. Ainda lembro do susto ao perceber o nascer do sol. Ainda escapolem sorrisos por conta dessas lembranças. Ainda espero o telefone tocar. Ainda está aqui o gosto do doce de leite/chocolate e açaí/tapioca. Ainda me perturbam as despedidas. Ainda me apertam o peito e deixam gostinho bom de queria muito mais. Ainda sinto o abraço apertado. Ainda tudo isso em mim.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Previsão

É engraçado e meio desconcertante quando os seus pressentimentos acontecem. Você fica com vários pontos de interrogação pululando ao redor de si, querendo entender como poderia ter antevisto aquilo tudo, tentando descobrir de onde surgiram essas convicções estapafúrdias, improváveis e - veja só, que se confirmam. Não é uma memória remanescente vinda não sei de onde, é uma antecipação de um momento futuro que depois efetivamente acontece. É como um déja-vu ao contrário, em que se tinha a certeza de que as coisas correriam de certo modo e elas ocorrem.
 
Fico aqui com uma avalanche de sentimentos desconexos e incongruentes. Uma ansiedade que não consigo aplacar. Uma vontade de rodar em sentido horário os ponteiros do relógio para antecipar o final da história e ver se, como estes, os outros pressentimentos se confirmam. Ao mesmo tempo, uma vontade de girar no sentido anti-horário, só para reviver aquelas horas, voltando àqueles momentos que se anteciparam muitos meses na sua mente. Por outro lado, há uma serenidade surpreendente, a calmaria e a paz de navio atracando no porto de origem, a sensação de voltar pra casa e, como se não fosse bastante, ainda essas vertigens e revoadas que não me deixam esquecer do que foi bom.
 
E aí, no reboliço das coisas recentes que a gente sabe que ficarão marcadas para sempre, vivendo ainda a rebordosa de tantos acontecimentos delicados, digerindo ainda os fatos mais simples e mais importantes; eu sigo aqui tentando (em vão?) postergar essa sensação de felicidade, que se depreende de coisas tão pequenas e íntimas e simples e que, por isso mesmo, é a mais real e verdadeira que tive nos últimos tempos.
 
 
 
 

sexta-feira, 4 de março de 2011

Será? Será?

Eu tenho que confessar que gostar de você é fácil. Gostar de você é leve, é descomplicado, é bonito de sentir. Gostar de você me faz esquecer que estou aqui e você longe, me faz esquecer que eu tenho correntes nos calcanhares, me faz esquecer do medo e derruba os muros de defesa que construí ao meu redor. Gostar de você é simples, espontâneo, instantâneo. Gostar de você não tem palavras, jargões, padrões, esquemas, estratégias. É o que é. É esse bem querer gratuito, altruísta, de quem se importa, de quem quer mais, de quem não quer nem saber como seria sem. Gostar de você é assim calmo, assim tranquilo, assim inevitável. Era a única coisa que eu poderia fazer depois de ter sido cercada no meu próprio castelo, depois de ter lutado contra a insistência e de ter perdido a batalha de auto-proteção. Era o que me restava fazer depois de ser surpreendida com o conhecimento da causa que abraçou. Gostar de você é permitir que alguém desbrave os recônditos intocados de mim. É me deixar levar ao sabor da brisa e do balanço do mar. Gostar de você é gostar até quando você não está, porque é sabê-lo logo, em breve. Gostar de você é delirar um pouquinho, tirar os pés do chão um pouquinho, afrouxar um pouquinho as rédeas da vida e seguir assim, leve, plena, doce. Gostar de você é permissão, é tomar susto com a convicção e perceber que não há espaço para nãos. Gostar de você é recuperar gosto pela vida e deixar que nos empurre para o abismo infinito de nós dois.

quarta-feira, 2 de março de 2011

E se for mais forte do que eu?

Eu preciso de convicção. Eu preciso ter certeza de que quer muito. Porque eu vou fazer testes de resistência e de personalidade. Eu vou me fingir de louca. Eu vou ser fria. Eu vou fazer o papel de forte e independente e de mulher madura e crescida, mesmo que meu peito anseie desesperadamente por um ombro pra me aconchegar e uma perna para jogar minha perna por sobre. Eu vou falar que não, enquanto meu corpo todo vai vibrar o sim. Eu vou fugir inúmeras vezes. Eu vou dar foras. Eu vou dizer que é indiferente. Eu vou achar que a esmola é demais. Eu não vou acreditar. Eu não vou me convencer. Eu vou sempre pensar nos poréns, nos talvez e em cada um dos apesares. Eu vou resistir. Eu não vou me jogar. Eu vou tentar a todo custo, de todas as formas escapar, me proteger, não me envolver. Por isso tudo, é preciso persistência, paciência, força de vontade. Não, não é impossível. Mas é que eu tenho medo, sabe? E aí, é precio convicção e firmeza. É preciso foco e persistência.
 
Mas e se for mais forte do que eu?